10.17533/udea.efyd.v34n1a07
URL DOI:http://doi.org/10.17533/udea.efyd.v34n1a07
MOISÉS LOPES SANCHES JUNIOR 1
CAMILA LOPES DE CARVALHO 2
MARINA BRASILIANO SALERNO 3
PAULO FERREIRA DE ARAÚJO 4
1Doutor pela Faculdade de Educação Física da Universidade
Estadual de Campinas.
Docente do Curso de Pedagogia e Educação Física da Universidade Adventista
de São Paulo, Pesquisador Linhas de Pesquisa: Políticas educacionais,
Avaliação educacional e educação, diversidade e saúde (Hortolândia,
Brasil).
moises.sanches@gmail.com
2Doutoranda pela Faculdade de
Educação Física da Universidade Estadual de Campinas.
Pesquisadora do Departamento de Atividade Motora Adaptada da Faculdade de
Educação Física da Universidade Estadual de Campinas, Linhas de Pesquisa:
Educação inclusiva e educação física inclusiva
camilalopes.c@hotmail.com
3Doutora em Atividade Motora
Adaptada pela Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de
Campinas (FEF – UNICAMP).
Docente do curso de Educação Física da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul. Linhas de Pesquisa: Educação física escolar e inclusão da
pessoa com deficiencia (Campo Grande-Brasil).
marina.brasiliano@gmail.com
4Doutor em Educação Física pela
Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas (FEF –
UNICAMP).
Professor Titular do curso de Educação Física da Faculdade de Educação
Física da Universidade Estadual de Campinas (FEF – UNICAMP), Linhas de
Pesquisa: Atividade física para pessoas com deficiências
(Campinas-Brasil).
paulof@fef.unicamp.br
| Sanches-Junior M. L.; Carvalho, C. L.; Salerno, M. B.; Araújo, P. F. (2015). Concepções e práticas da inclusão na Educação Física escolar: estudo em uma cidade do Brasil. Educación Física y Deporte, 34 (1), XX-XX Ene-Jun. http://doi.org/10.17533/udea.efyd.v34n1a07 |
RESUMO
Pesquisas a respeito das condições de
deficiência em crianças e adolescentes apontam para a necessidade de um
fazer docente que respeite a diversidade humana. Assim, este trabalho visa
verificar a percepção dessa realidade através dos olhares e ações do
profissional da Educação Física, bem como de seus pares na gestão escolar,
no intuito de perceber possíveis demandas e lacunas na relação
teoria-prática do processo da inclusão. Para isso, foram aplicados
questionários pré-elaborados nas 40 (quarenta) escolas do município de
Hortolândia, São Paulo, Brasil, identificando as ações e percepções dos
profissionais potencialmente fomentadores da ação inclusiva. A pesquisa
encontrou como resultado os gestores entendendo estarem de fato
contribuindo com a inclusão enquanto os professores se mostrando com
sentimentos de incapacidade para implantá-la nesse momento. Contudo a
maioria dos respondentes, tanto professores quanto gestores, demonstraram
acreditar na viabilidade do processo inclusivo, com necessidade do
desenvolvimento de conhecimento e apoio para tal.
PALAVRAS CHAVE: Educação Especial; Educação Física e Treinamento;
Administração de Recursos Humanos.
RESUMEN
Este estudio tiene como objetivo verificar
la percepción de la realidad desde la mirada y las acciones del
profesional de Educación Física, así como desde la perspectiva de sus
compañeros de la gestión escolar con el fin de identificar posibles
demandas y carencias en la relación teoría-práctica del proceso de
inclusión. Para esto, se aplicaron cuestionários pre-elaborados en las 40
(cuarenta) escuelas de la ciudad de Hortolandia, Sao Paulo, Brasil,
identificando las acciones y percepciones de los profesionales
potencialmente desarrolladores de la acción inclusiva. La investigación
encontró como resultado que los administradores creen, de hecho, que están
contribuyendo con la inclusión, mientras los profesores se muestran con
sentimientos de incapacidad en su aplicación. Sin embargo, la mayoría de
los entrevistados, tanto los profesores como los administradores, han
demonstrado creer en la viabilidad del proceso inclusivo, lo que requiere
el desarrollo del conocimiento y apoyo para hacerlo.
PALABRAS CLAVE: Educación Especial; Educación Física y Entrenamiento;
Administración del Recursos Humanos.
ABSTRACT
Research into the conditions of deficiency
in children and adolescents points to the need of a teacher that respects
human diversity. This study aims to verify the perception of this reality
through the eyes and actions of the physical education professional, as
well as their peers in school management in order to realize possible
demands and gaps in the theory-practice relationship of the inclusion
process. For this, pre-prepared questionnaires were applied to 40 (forty)
municipal schools of Hortolandia, Sao Paulo, Brazil, identifying the
actions and perceptions of potential professionals developers of inclusive
actions. The research found as a result managers understand they are in
fact contributing to the inclusion as teachers are showing disabled
feelings to deploy it at that time. However, most respondents, both
teachers and managers showed believe in the viability of the inclusive
process, requiring the development of knowledge and support to do so.
KEYWORDS: Special Education; Physical Education and Training; Human
Resource Managemen.
INTRODUÇÃO
A Educação Física Brasileira passou por
nítida modificação conceitual desde 1980/81 devido às inquietações dos
movimentos inclusivos, porém essa se reflete muito mais no ambiente social
e das competições esportivas, com pouco reflexo na prática da Educação
Escolar. À margem dessas questões, avoluma-se outra discussão com espaço
significativo como mudança de paradigma. Como proposto por Araújo (1998),
vivenciamos três recortes temporais e conceituais nesta temática da
inclusão: enfoque médico/corretivo num primeiro momento, sua transição
para o psicopedagógico, e num terceiro momento para o enfoque pedagógico.
Já no que se refere à inclusão, conseguimos abstrair cinco correntes
referentes ao local da inclusão e seus pressupostos:

F.IGURA 1 As cinco correntes educacionais
Dessa forma, averígua-se que as cinco correntes educacionais as quais existiram durante o caminhar à inclusão educacional são:
1. Educação Especial –
Limites de aprendizagem necessitam de demandas especiais;
2. Educação Regular com Salas Especiais – Permitir o
acesso à escola, com um lugar “especial” para o deficiente;
3. Ensino Regular – Todos são iguais;
4. Ensino Regular Adaptado – A existência de
necessidades especiais implica em adaptações ao ensino regular;
5. Ensino Regular + Educação Especial – Igualdade de
condições na escola, com trabalho complementar para as necessidades
especiais.
Sendo um país em desenvolvimento influenciado pelo desenvolvidos, a chegada da educação brasileira ao enfoque pedagógico e à educação inclusiva, com o ensino regular atuando conjuntamente com a educação especial, teve seus primórdios oriundos da tensão exclusão-inclusão dos EUA. Stainback & Stainback (1999) relatam questões pontuais a partir da última década de 1700, com a introdução do conceito de educação da Pessoa com Deficiência (PCD) por Benjamin Rush. No fim da Guerra Americana da Independência, em 1783, grupos de cidadãos ricos estabeleceram sociedades filantrópicas visando garantir que grupos marginais não ameaçassem a República e os valores norte-americanos, iniciando a separação entre escolas públicas e instituições de reabilitação e trazendo uma série de ações públicas e privadas que culminaram na expansão paralela entre instituições regulares e de educação especial.
Conforme aponta a literatura (Sassaki, 1997; Stainback & Stainback, 1999; Machado, 2001), as bases para o que hoje conhecemos como inclusão estavam lançadas a partir do princípio de normalização, em 1950, a qual objetivava proporcionar à PCD ou as Pessoas com Necessidades Educativas Especiais (PNE) modelos de vida que mais se aproximassem dos padrões e condições ditas normais da sociedade.
Como consequência de movimentos de associações de pais de alunos reivindicando o direito de que seus filhos (PNE) tivessem direito a educação junto de seus pares, entre os anos de 1960 e 1970 avolumaram ações e provisionamentos legais que sustentaram o direito à educação gratuita e à assistência a essa população. Porém, somente entre as décadas de 1970 e 1980, os sistemas educacionais, regular e especial, foram de fato desafiados com um novo princípio, o da Integração, na qual os alunos que inicialmente estavam em classes separadas foram, aos poucos, sendo integrados às classes regulares (Stainback & Stainback, 1999).
No contexto social o que se aguardava como produto deste processo integrativo consistia do esforço e expectativa de que as PNE alcançassem um nível de competência compatível com os padrões sociais vigentes. Portanto, a sociedade de braços abertos e paradoxalmente, cruzados, aguardava a chegada dessa população sem se preparar para tanto (Sassaki, 1997).
Na década de 1990 o movimento de inclusão, defendendo a garantia que todos os alunos façam parte do mesmo contexto escolar, participando das mesmas atividades comuns, todavia, adaptadas para atender às diferenças individuais, ganharia um ímpeto com mobilização internacional na direção de uma Escola para Todos, influenciando tribunais, escolas e governos no sentido de uma reforma educacional.
Conforme aponta Silva (2005), movimentos importantes marcaram esse período e promoveram um repensar dos rumos, impactando diretamente a Legislação em diversos países, como:
• 1990 - Conferência
Mundial de Educação para Todos;
• 1992 - Seminário Regional Sobre Política, Planejamento
e Organização da Educação Integrada para Alunos com Necessidades
Especiais;
• 1993 - V Reunião do Comitê Regional Intergovernamental
do Projeto Principal de Educação na América Latina e Caribe;
• 1993 - 85a Assembléia Geral das Nações Unidas,
resultando nas Normas Uniformes sobre a Igualdade de Oportunidades para
Pessoas com Incapacidades;
• 1994 - Conferência Mundial Sobre Necessidades
Educativas Especiais.
Como consequência dessas ações internacionais e de movimentos sociais em defesa dos direitos humanos, o Brasil iniciou uma série de medidas. Inicialmente, em 1961 a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabeleceu o direito dos “excepcionais” à educação”. Em sequência, foi criado o “Centro Nacional de Educação Especial” (CENESP), pelo Decreto n° 72.425, de 03 de julho de 1973, objetivando discutir ações e temas relacionados à educação especial. Nas últimas décadas, a Constituição Federal do Brasil de 1988 e a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n°9.394 de 20 de dezembro de 1996, estabeleceram legalmente a educação inclusiva no cenário nacional, determinando a ocorrência da educação especial preferencialmente na rede regular de ensino (Jannuzzi, 2006).
E dessa forma a Educação Física
Brasileira se viu despreparada em termos de conteúdos que deem conta
dessa nova clientela.
No Brasil, de início a educação física abriu-se para a participação das
pessoas com deficiência por meio da criação de clubes de esportes
destinadas a essa população por iniciativas desse próprio público.
Associadas aos movimentos sociais e políticos de defesa das PCD, em 1952,
define-se a Educação Física Adaptada (EFA), sendo esta uma educação física
a qual permite a participação de pessoas com diferentes necessidades em
seu grupo de alunos por meio da adaptação das atividades, técnicas,
métodos e formas de organização segundo as necessidades de cada um.
Posteriormente, a área recebe outros nomes, como educação física inclusiva
ao ambientar-se no contexto educacional legal da inclusão (Araújo, 1998;
Silva, 2005; Silva, Seabra Jr. & Araújo, 2008).
Contudo, assim como o sistema educacional, a EFA tem passado por dificuldades para atuar em conformidade nessa nova realidade, como mostrado em estudos recentes - como precariedade na formação de professores, dificuldade na adaptação da organização e pedagogia escolar, falta de informação sobre as condições do aluno e sobre as adaptações necessárias, ações descontextualizadas e insegurança para intervir na prática, presença de ações integradoras baseadas no paradigma médico ao invés de práticas pedagógicas inclusivas (Silva, Seabra Jr. & Araújo, 2008; Filus, 2011; Seabra Jr., 2012; Carvalho, 2014; Salerno, 2014).
Conforme Silva, Araújo & Duarte (2004), vivemos um período de transição, de encontros e desencontros no lidar com as diferenças, mas, algo precisa e deve ser feito na direção de alcançar os objetivos deste novo momento.
Nesse contexto, o objetivo desse estudo é investigar a percepção do professor de educação física, bem como dos gestores de sua escola, sobre a inclusão de alunos com necessidades especiais, focalizando aspectos que perpassem a formação docente, como sua percepção do "momento inclusão", suas necessidades e crenças quanto ao processo da inclusão.
MÉTODOS
Tipo de estudo
O estudo teve sua metodologia estruturada como uma pesquisa de campo por
meio de um estudo de caso. Nesta, buscam-se os dados no local onde ocorrem
de forma a possibilitar uma análise de algo já estruturado nas definições
literárias (Santos, 2002). Quanto à natureza, optamos pela pesquisa de
campo qualitativa cujo instrumento utilizado foi o questionário com
perguntas abertas e fechadas pelo caráter descritivo dos dados e pela
possibilidade da coleta dos dados no ambiente natural dos fenômenos, bem
como da compreensão do significado das situações, comportamentos e
percepções que cruzam a interpretação do pesquisador e dos pesquisados. A
adoção preferencial do modelo qualitativo não exclui a presença de
organizações dos dados de natureza quantitativa como quantidades de
respostas com concepções ideológicas convergentes, apenas a prioridade da
análise reside na interpretação dos dados pelo viés qualitativo dos
mesmos.
Local do Estudo
A pesquisa foi realizada no município de Hortolândia, localizado na Região
Metropolitana de Campinas, no centro do Estado de São Paulo, Brasil. O
município tem 18 anos desde sua emancipação em Maio de 1991, surgindo no
cenário brasileiro como a cidade de maior crescimento previsto para os
próximos cinco anos nas áreas de Demografia, Economia, Empregabilidade e
Educação. Possui em sua totalidade 21 instituições de ensino fundamental,
nível de ensino esse escolhido por ter a presença do professor de educação
física e ser regido por políticas de âmbito municipal.
População do Estudo
A população desse estudo compreendeu todos os professores e gestores das
21 escolas do Ensino Fundamental Público do município de Hortolândia, no
estado de São Paulo, Brasil, nas quais há um total de 76 alunos com
necessidades especiais inclusos. Como sujeitos da pesquisa foram inclusos
todos os professores de educação física e gestores das respectivas
escolas, objetivando a reunião de dados completos para traçar a realidade
desse município. Dentre os professores de educação física todos os 12
responderam ao questionário, enquanto apenas 35 gestores (sendo 17
diretores e 18 coordenadores) de uma totalidade de 42 responderam, sendo
os demais escusos na participação.
Avaliação
Os dados foram coletados pelo próprio pesquisador, com a utilização de
questionários aplicados à população selecionada, em datas e horários
previamente agendados. A aplicação foi precedida por explanação prévia do
objetivo da pesquisa, sua finalidade e forma de desenvolvimento, bem como
da firmação por escrito dos termos de consentimento.
Em relação aos questionários, estes foram elaborados pelo próprio pesquisador para ser aplicado nessa pesquisa. Por conseguinte, um projeto piloto desse questionário foi construído e submetido, anteriormente a sua aplicação, a uma validação de face na qual 5 professores especialistas contribuíram com correções e esclarecimentos, com posterior adaptação e construção de sua versão final. Este é composto por questões fechadas - referentes à atuação profissional e experiência com pessoas com deficiência - e abertas - referentes aos conceitos de inclusão, educação especial, capacitação do professor para trabalhar com inclusão -, possibilitando análises qualitativa e quantitativa das respostas.
A pesquisa foi submetida à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa - CEP da Faculdade de Ciências Médicas - FCM da UNICAMP, sendo aprovada sob o número de processo 0396.0.146.000-09.
Análise de Dados
Os dados obtidos na coleta foram tratados por análise descritiva e
comparativa dos mesmos às correntes conceptivas da EFA e da Educação
abordadas na discussão teórica.
Na análise qualitativa, foram estabelecidas categorias de agrupamento das respostas por meio da análise de conteúdo e regras de hermenêutica das questões abertas, adotando como parâmetros a incidência de palavras-chave, abordagem semelhante e conceituação comum.
Como apontam Puglisi & Franco (2005), na análise de conteúdo partimos da mensagem central do texto, porém consideramos as condições contextuais de seus produtores e ancoramos numa concepção crítica e dinâmica da linguagem.
Na análise quantitativa, foram avaliadas as
diferenças nas proporções das respostas entre gestores e professores.
Os dados coletados foram agrupados em informações de identificação da
experiência com PNE, conceitos e paradigmas ligados à Inclusão, Educação
Especial e PNE, percepção da prática de Inclusão nas unidades escolares,
viabilidade da Inclusão em Escola Regular, viabilidade da Educação
Especial (fora da Escola Regular), percepção individual quanto à
capacitação e dificuldades pessoais encontradas no processo da inclusão.
Posteriormente, os dados foram agrupados em categorias de respostas
permitindo comparações entre eles na busca de correlações causais ou não,
interdependentes ou excludentes, complementares ou suplementares às
hipóteses da pesquisa.
RESULTADOS
Neste trabalho questionamos as questões conceituais da inclusão, suas possibilidades, a prática da inclusão nas escolas do município estudado e a percepção dos entrevistados quanto a sua capacidade e dificuldades em lidar com a inclusão.
Em relação aos entrevistados, quanto à faixa etária, as escolas apresentam um corpo de profissionais jovem, com 35% de seus integrantes entre 25 e 34 anos e 76% abaixo de 40 anos. Esse dado revela-se bastante promissor, uma vez que intervenções realizadas no município poderão ser aplicadas e validadas pelos mesmos profissionais antes de sua aposentadoria. Além deste fato, populações jovens tendem a carregar menos vícios, serem mais propensas a aceitar mudanças e apresentarem mais disposição a buscar novos conhecimentos. Quanto ao gênero, o dado mais significativo reside na quase totalidade de mulheres na gestão (34 mulheres e 01 homem), contra uma maioria masculina no magistério de Educação Física (10 homens e 2 mulheres).
Desses profissionais, 100% possuíam
graduação e 75,5% cursos de pós-graduação, sendo que 82% dos pesquisados
concluíram o curso sob a égide do Decreto nº 3.298, de 1999 que
regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989 e dispõe sobre a
Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, a
vigência da Nova LDB - 9394/96, e, sob o ponto de vista da inclusão, após
a declaração de Salamanca (1994).
No âmbito qualitativo, o resultado do conceito de inclusão demonstrou que
essa conceituação figura como uma construção pessoal sem correlação com os
demais fatores da pesquisa, cargo, gênero, experiência ou formação
acadêmica.
Os conceitos de inclusão apresentados pelos entrevistados foram agrupados em 5 categorias conforme a ênfase de cada respondente, com uma sexta variável para os que não apresentaram nenhum conceito:
1. Direito de
acesso/Garantia de acesso/ Mudança social que garanta o acesso/Direito de
Atendimento;
2. Socialização/ Integração;
3. Atender todos os alunos em suas múltiplas
necessidades;
4. Respeitar e conviver com as
diferenças/acolhimento/tratar com dignidade;
5. Colocar todos, independente da necessidade no mesmo
processo educacional;
6. Sem definição.
A quantidade de respondentes para cada um desses seis conceitos apresenta-se no gráfico abaixo:

Gráfico 1 . Quantidade de respondentes de cada conceito de inclusão
Posteriormente, perguntamos sobre a relação possível entre Inclusão e Educação Especial. Este dado se mostrou independente dos demais fatores, e as justificativas alegadas foram agrupadas nas 5 categorias abaixo:
1. Apresentam objetivos e
conhecimentos comuns
2. São complementares
3. Tem objetivos diferentes
4. Por causa da necessidade de profissionalismo e/ou
atendimento especializado
5. Sem Explicação
Dentre os respondentes, 38 disseram existir relação entre a inclusão e a educação especial (apresentando como justificativas as categorias 1 e 2) contra 7 que não notam relação. Desses 7, todos usaram como justificativa as categorias 3 e 5.
Pedimos, sequencialmente, que os respondentes definissem quem é a PNE, e como resultado identificamos as linhas distintas de abordagem abaixo:
1. Limitação funcional ou
de realização de atividades
2. Limitação de aprendizagem
3. Todos que apresentam alguma limitação
4. Deficiência física ou mental
5. Pessoas com limitações físicas ou mentais que
necessitam de atendimento diferenciado para desenvolver-se
6. Todo ser humano é portador de alguma necessidade
especial
7. Não atendem os padrões/ anormais
8. Sem Definição
A quantidade de respondentes para cada uma dessas linhas pode ser visualizado no gráfico abaixo:

Gráfico 2. Quantidade de respondentes de cada linha de resposta
Sobre quem é a PNE, sem correlação direta destes dados com nenhum outro fator observado, agrupamos as respostas em 3 categorias: a abordagem das limitações ou incapacidade (definições 1, 2, 3 e 5); a abordagem das deficiências - anormalidade (definições 4 e 7) e abordagem da igualdade ou nivelamento (definição 6).
Observamos que a grande maioria dos
pesquisados atribuem à PCD ou PNE o foco da limitação, da deficiência e da
anomalia.
Indagamos ainda que os educadores e gestores dissessem e justificassem se
eles consideravam que a escola onde trabalham pratica a inclusão.
Agrupamos as justificativas em 3 padrões de respostas – Sim, Não e
Parcialmente -, pois uma grande parte dessas apresentavam condicionalidade
e/ou necessidades percebidas na prática (exemplo: "praticamos em parte",
"praticamos mais ou menos"...). Os resultados dessa indagação são
explicitados no gráfico a seguir:

Gráfico 3. Percepção da sobre a prática da Educação Inclusiva na Unidade Escolar do Respondente
Foi notado que os cargos de gestão tem tendência às respostas afirmativas quanto à prática da inclusão em suas unidades escolares enquanto os professores de Educação Física tendência negativa.
Ainda perguntados sobre a Inclusão ser realizada na forma de educação especial, tanto gestores quanto professores de educação física sinalizam fortemente a crença de que o ideal é a inclusão na escola regular, com o apoio da educação especial para as questões de maior gravidade.
No âmbito quantitativo, algumas definições foram possíveis e contribuem como fundamentação dos dados acima.
Quanto aos conceitos de inclusão, aproximadamente 67% dos respondentes relacionam inclusão as questão do atendimento e do direito de acesso, conceitos estes que podem ser agrupados em 2 categorias, nas quais 36,7% apresentaram conceitos de natureza sócio-política e técnicos, e 63,3% ligados ao discurso político e/ou social. Nota-se que 43% dos professores de educação física não conseguiram justificar sua posição sobre a relação entre inclusão e educação especial contra 32% dos demais profissionais.
Quanto às necessidades apontadas por todos
os respondentes para melhor qualidade no processo de uma Educação
Inclusiva, 57% citaram a necessidade de suporte pedagógico,
infraestrutura, recursos e apoio profissional, enquanto 43% citaram o
preparo profissional.
Sequencialmente, perguntamos aos participantes sobre suas crenças quanto à
viabilidade da inclusão em uma escola regular e ao papel da Educação
Especial.
Segmentado por cargo, 85,7% dos gestores creem no processo da Educação Inclusiva sem ressalvas contra apenas 50% dos docentes de Educação Física. Enquanto 50% dos docentes não creem ou creem com reservas no processo da inclusão, apenas 14,3% dos gestores e coordenadores tem alguma condição para confirmar a crença, havendo maior descrença por parte dos que atuam diretamente ligados aos alunos.
Essa mesma correlação se dá com o tempo de experiência docente, com aumento na crença da viabilidade nas menores faixas de tempo e decréscimo nas maiores, por sua vez o nível de exigências para a viabilidade amplia nas maiores faixas etárias, o que parece denotar um maior nível de ceticismo e/ou criticismo nos que tem maior experiência.
Como última questão, verificamos a percepção dos participantes quanto ao seu nível de capacitação para trabalhar com as PNE bem como suas principais dificuldades, conforme demonstrado no Gráfico 4:

Gráfico 4 - Percepção dos respondentes quanto a sua capacitação para o trabalho com PNE
Somados os que não se veem capacitados aos que se consideram parcialmente habilitados, a extensa maioria carece de atenção formativa para lidar com as questões da PNE. Uma vez que 77% dos entrevistados apresentam um senso de incapacidade total ou parcial para lidar com as questões das PNE, fomos analisar quais as principais dificuldades relatadas por eles.
O resultado é que 17% das dificuldades concentram-se em questões do lidar com o complexo e o heterogêneo, 49% estão ligadas a conhecimento específico, 10% são fatores emocionais e 8% a questões de apoio. Dessas dificuldades, os gestores concentram as dificuldades nos fatores de conhecimento específico e emocionais enquanto os professores de Educação Física concentram suas dificuldades em como lidar com grupos grandes/heterogêneos e na questão do suporte pedagógico, recursos e apoio profissional.
CONCLUSÕES E DISCUSSÕES
A priorização deste estudo de focar nas compreensões do professor de Educação Física se dá em virtude de entendermos ser ele na escola, articulador primário entre os campos da saúde e da educação, resultante de sua formação acadêmica. Secundariamente a este grupo, focamos, em comparação, o grupo gestor da escola, por entendermos que o processo inclusão carece de demandas administrativas e funcionais que extrapolam a ação docente e esbarram nas concepções daqueles que coordenam o processo educacional.
Sendo a maioria dos profissionais formadas
num período já abarcador dos conceitos de inclusão, sua formação
acadêmica, portanto, deveria carregar pressupostos quanto às questões da
diversidade e da inclusão preconizados por esse novo período de tratativas
legais e posicionamento ideológico.
Por conseguinte, pode ser observado um entendimento de inclusão com base
nos aspectos legais do direito ao acesso. Partindo do referencial da
exclusão, é possível supor que o conceito de exclusão presente no ideário
do grupo pesquisado está, em sua grande maioria, relacionado com perda de
direitos, de liberdade, de acesso, conduzindo à interpretações de que a
inclusão se processe quando restaurado o direito de acesso à escola
regular, desconsiderando outros aspectos.
Considerando que 86% dos que responderam que não existe relação entre Inclusão e Educação Especial compreendem os professores de Educação Física, e levando-se em conta a tendência de justificativa adotada, talvez possamos inferir que para este grupo em particular a educação especial não seja vista como complementar à educação regular (inclusão), seja por ter objetivos distintos, seja por alguma intuição resultante da prática ou formação. Isso abre um espaço para discussões de políticas públicas no que tange a formação continuada e apoio específico para os profissionais que lidam com esta população.
Considerando ambos os dados acima mencionados, pode ser feita uma aproximação destes aos estudos de Rodrigues (2003), os quais destacam uma relação entre uma formação precária dos professores sem capacitação adequada para educação inclusiva, principalmente os profissionais com formação anterior às definições legais, e maior dificuldade na compreensão e concretização prática de uma aula inclusiva.
Pode-se também depreender dos resultados apresentados que o discurso teórico e o legal da atualidade parecem caminhar na direção de considerar que toda pessoa é, de alguma forma, especial e possui alguma necessidade que carece de atenção. Isso pode ser associado a uma alteração na compreensão e valorização da pessoa com deficiência, em substituição ao anterior modelo segregacionista, o qual difundiu um ideal de rejeição às diferenças, conforme apresentado na literatura (Jannuzzi, 2006).
Quanto à justificativa apresentada pelos professores de Educação Física para entenderem que suas escolas não praticam Educação Inclusiva, esta é dada na direção de que as unidades recebem PNE, porém a simples presença dos alunos não caracteriza a inclusão, já que condicionam uma Educação Inclusiva ao suporte pedagógico, infraestrutura, recursos e apoio profissional.
Há uma correspondência significativa entre as justificativas apresentadas por esses professores e os dez elementos críticos para a criação de comunidades de ensino inclusivo e eficaz apresentada por Stainback & Stainback (1999), os quais são o estabelecimento de uma filosofia comum e um plano estratégico, a presença de uma liderança forte, o desenvolvimento de uma cultura de acolhimento da diversidade, estabelecer redes de apoio, delegar responsabilidades a todos da comunidade escolar, proporcionar assistência e flexibilidade, refletir sobre abordagens de ensino, comemorar sucesso e analisar constantemente e criticamente as mudanças.
Por outro lado, os que têm cargo na gestão escolar, tendem a responder afirmativamente à questão, mas curiosamente, concentram suas justificativas para a prática de educação inclusiva aos mesmos fatores que motivaram os professores de EF a postularem opostamente, ou seja, a simples presença de alunos de inclusão.
Observamos que os gestores tendem a conceituar a inclusão por aspectos de ordem política e de direito de acesso, enquanto os profissionais da educação física tendem a considerar aspectos de ordem mais técnica, além da influência dos sistemas públicos de gestão e questões de políticas públicas, talvez devido ao fato que gestores e professores seguem caminhos distintos em suas relações com o Sistema Educacional.
Esses resultados constituem fortes balizadores para as ações de treinamento, direcionamento político, recursos e outros ferramentais que apontem na direção da união teoria-prática no que se refere à inclusão, indo ao encontro de estudos que mostram essa necessidade de articulação de ações práticas eficazes com a legislação já definida (Silva, 2005; Filus, 2011; Seabra Jr., 2012; Carvalho, 2014).
Notamos que mudamos de tempos na educação,
mas ainda carecemos mudar de olhares quanto ao sujeito desta mesma
educação.
Ao compararmos preliminarmente as concepções que permaneceram mesmo após
os períodos de mudança, a sinalização conceitual de PNE ligada
prioritariamente às diferenças, as justificativas para as questões da
inclusão escolar X educação especial, ainda nos mostram que mudamos de
tempos na educação, mas ainda carecemos de mudar de olhares quanto ao
sujeito desta mesma educação.
A percepção da força das políticas públicas como molas propulsoras dos desafios, posto que guardam uma esperança pelo fato de que influem fortemente na mudança das estruturas que compõem a educação, têm como contrapeso o fato da descrença e da incapacidade de alterar a concepção dos indivíduos. Esta, nos parece ser possível modificar unicamente pela educação e prática.
Em suma, o que os decretos legislacionais podem fazer é abrir espaços, mas quem terá de dar conta da mudança de mentalidade, do engajamento, da prática, serão preliminarmente as agências formadoras e as próprias unidades dos sistemas de ensino.
Como papel de formação, o desafio das agências formadoras de docentes será conseguir "contaminar" no bom sentido seus alunos com o "virus" da inclusão, desafio este que passa pelo fato de que tais alunos foram educados durante sua vida acadêmica pregressa em uma escola dicotômica quanto a esse tema.
Por sua vez, talvez necessitemos de uma geração inteira que conviva com a inclusão nas escolas regulares, mesmo que ainda em estados precários, mas que pela convivência as concepções e os preconceitos mudem de formato, e essa nova geração, quando chegada à academia, terá outros pressupostos de construção para a discussão e ampliação do tema.
Nos parece um caminho sem retorno o fato de que a inclusão se dará na escola regular, pelo menos pelos próximos anos, e não somente isso, mas será parte integrante da discussão social como um todo. Nos resta discutir então, de que forma, com que recursos, em que formato, com que grau de apoio e com que parcerias tais ações e intenções serão levadas a efeito.
Quer nos parecer que o tempo de discussões como se dentro ou fora da escola, se doente ou com possibilidades, se comigo ou com outros, devam dar lugar a outras de maior relevância como em que desenho de escola, com que perfil docente, com que envolvimento da sociedade e com que comprometimento político.
Se o que pretendemos é uma mudança de concepção que alcance os currículos em todos os níveis da educação, mais do que achar culpados para o insucesso, estamos diante do desafio da divisão de responsabilidades e da execução das propostas que já possuímos. Enquanto que por um lado carecemos de comprometimento político-socialeconômico que sustente o ideário da educação escolar, de outra via carecemos também profissionais que desafiem o status quo no sentido de romper com o discurso e alcançar a prática.
O que a história nos demonstra é que todas as grandes mudanças, por mais belas que hoje pareçam, nasceram de sacrifícios desafiadores de pessoas que ousaram pensar, mas não só pensar, aplicar o pensamento à uma construção de caminhos que viabilizassem a ideia. É certo que seria insano atribuir tanto aos docentes quanto aos seus pares na gestão escolar toda a responsabilidade por uma escola verdadeiramente inclusiva.
Mas também é certo que enquanto o discurso politicamente correto não der lugar à transparência, configuração real dos problemas, ações práticas que apontem resultados efetivos dentro do próprio sistema, a retórica da legislação permanecerá como certa, pois seus resultados aparentes a consolidam. Apenas a guisa de exemplo, se a resposta da escola aos órgãos gestores e legislativo é a de que a inclusão é uma realidade como observado na pesquisa, então não carecemos de mudanças ou implementações pois a abordagem do decreto se consolidou.
O que nos chama a atenção, 15 anos após Salamanca e 13 anos após a nova LDB, é o fato de que as mudanças nos currículos das agências formadoras, bem como as estruturas que viabilizariam a inclusão não foram suficientes para sua consolidação. Mais que isso, a continuar tal direcionamento, o ceticismo manifesto nas justificativas dos agentes seja na gestão ou na docência da EF poderá se cristalizar numa força contrária a novas tentativas de implementação de educação inclusiva.
Igualmente nos chama a atenção o fato de que ainda estamos em um bom momento. A grande maioria dos educadores pesquisados no município ainda acredita na viabilidade do processo da inclusão, anseia por conhecimentos e requer apoio, o que configura esperança, uma luz no fim do túnel deste momento de transição.
Essa realidade aponta na direção da responsabilidade que temos como pesquisadores de apontar caminhos, delinear possibilidades e acelerar processos no sentido de consolidar o que já conquistamos ao longo da história, mas, também atuarmos com a mesma tenacidade dos que a modificaram antes de nós no sentido de procedermos às mudanças que ora se fazem importantes.
REFERÊNCIAS
Recepción: 07-02-2015
Aprobación: 20-05-2015