10.17533/udea.efyd.v38n1a04
URL DOI: http://doi.org/10.17533/udea.efyd.v38n1a04
O GRUPO FOCAL COMO ELEMENTO CENTRAL NO PROCESSO DE TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DOS SABERES A ENSINAR
THE FOCUS GROUP AS A CORE ELEMENT IN THE DIDACTIC TRANSPOSITION PROCESS OF KNOWLEDGES TO BE TAUGHT
EL GRUPO FOCAL COMO EL ELEMENTO CENTRAL EN LO PROCESSO DE LA TRANSPOSICIÓN DIDÁCTICA DE LOS SABERES A ENSEÑARSE
Luis Eugênio Martiny1
Pierre Normando Gomes-da-Silva2
1 Licenciado en Educación Física de la Universidad Regional del Noroeste del Estado de Río Grande del Sur. - Máster en Educación Física de la Universidad de Pernambuco, Brasil. - Miembro del grupo de estudio e investigación de Educación Física: Iniciación a la enseñanza y Entrenamiento continuo.
2 Profesor de la Universidad Federal de Paraíba. - Doctor en Educación de la Universidad Federal de Río Grande del Norte. - Pos Doctor en Educación Física de la Universidad Federal de Santa Maria.
Cómo citar este artículo:
Martiny, L. E. & Gomes-da-Silva, P. N. (2019). O grupo focal como elemento central no processo de transposição didática dos saberes a ensinar. Educación Física y Deporte, 38(1), xx-xx. DOI: http://doi.org/10.17533/udea.efyd.v38n1a04
Resumo:
Objetivo: identificar
qual é o elemento central que
ajuda aos Professores em Formação Inicial (PFI) a realizarem a
transposição
didática dos saberes a ensinar. Método:
nesta pesquisa participaram três PFI do curso de Educação Física da
Universidade Federal da Paraíba-Brasil. As técnicas de coleta de dados
foram:
observação participante, grupo focal e análise de documentos escritos.
Para a
análise dos dados foi utilizada a técnica de análise categorial de
conteúdo por
temática. Resultados: identificou-se
o
grupo focal como o elemento central de auxílio na transposição
didática dos
saberes a ensinar. Conclusão:
esta
condição evidencia três importantes implicações para a prática
pedagógica dos
PFI: a coletividade, a reflexão que desencadeia a ação e a permanência
do
estado reflexivo.
Palavras chaves: professores em formação, transposição
didática, ensino,
grupo focal.
Abstract:
Objective: To identify which is the central element helping new trainee teachers (PFI, from its Portuguese initials) to carry out the didactic transposition of knowledge to be taught. Method: Three PFIs participated in the Physics Education Course of the Universidade Federal da Paraíba. Participant observation, focus group, and written documents were the data recollection techniques. To analyze data, the content analysis technique of categorical type by subject was used. Results: The Focus Group was identified as the central aid element in the didactic transposition of knowledge to be taught. Conclusions: This condition demonstrates three important implications to the pedagogical practice of PFIs: the collectivity, the reflection that triggers action, and the continuity of the reflexive state.
Keywords: Trainee teachers, didactic transposition, teaching, focus group.
Resumen
Objetivo: identificar cual es el elemento central que auxilia a los profesores en formación inicial (PFI) que realicen la transposición didáctica de los saberes a enseñarse. Método: en la investigación participaron tres PFI del curso de Educación Física de la Universidad Federal de Paraíba. Las técnicas de recolección de datos fueron: observación participante, grupo focal y documentos escritos. Para analizar los datos fue utilizada la técnica de análisis de contenidos del tipo categorial por temática. Resultados: se identificó el Grupo focal como el elemento central de auxilio en la transposición didáctica de los saberes a enseñarse. Conclusión: esta condición demuestra tres importantes implicaciones para la práctica pedagógica de los PFI: la colectividad, la reflexión que desencadena la acción y la permanencia del estado reflexivo.
PALABRAS CLAVE: profesores en formación, transposición didáctica, enseñanza, grupo focal.
INTRODUÇÃO
O reconhecimento de que existe um processo que se faz necessário para modificar (no seu sentido adaptativo e construtivo) o saber quando o mesmo se define como objeto de estudo na escola não é algo distante do meio educacional. O processo de transformar o saber e discutir a sua trajetória até se tornar objeto de ensino tem sido alvo de significativas investigações entre os pesquisadores dentro do campo educativo (Bernstein, 2003; Gimeno & Pérez, 2000; Perrenoud, 1997, 2002). Leite (2007), por exemplo, afirma que existe a ideia da necessidade de algum tipo de adaptação do conhecimento (saber) quando se trata de ensiná-lo na escola.
Neste sentido, Chevallard (1998) se utiliza de um conceito, transposição didática (TD), que busca representar todo este movimento pelo qual passa o saber até se tornar escolarizável. Para a autor,
[...] um conteúdo de saber que tenha sido definido como saber a ensinar sofre, a partir de então, um conjunto de transformações adaptativas que irão torná-lo apto a ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O “trabalho” que faz de um objeto de saber a ensinar objeto de ensino é chamado de transposição didática (1998, p.39).
Quando se marca esta discussão para o âmbito da formação inicial de professores, os docentes que se encontram neste momento da sua trajetória profissional necessitariam, assim, apreender (no sentido de constatar, demonstrar, compreender e explicar) tais saberes e transporta-los para dentro do sistema educativo. Todo este contexto abre a possibilidade de problematização acerca de como ocorre esta transferibilidade de saberes da formação inicial para o campo de intervenção. Para Hernández (2004), esta condição é um dos requisitos que pode garantir a qualidade na educação (pelo viés da ação do professor).
Diante desta constatação, nos deparamos com as seguintes perguntas problematizadoras: Em que medida os Professores em Formação Inicial (PFI) conseguem redimensionar os saberes (científicos, disciplinares, das ciências da educação, entre outros), adquiridos na formação inicial e aplicá-los no contexto escolar? Na busca de um aprofundamento desta problemática levantada, formulamos a seguinte questão norteadora: Como ocorre a TD sobre os saberes a ensinar na prática pedagógica dos PFI no estágio supervisionado em Educação Física da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)?
Para conseguir realizar aproximações a esta questão norteadora buscamos, neste artigo, identificar qual o elemento central que sustenta a prática pedagógica destes PFI, quando ministram aulas dentro de um estágio supervisionado e quais as implicações com a TD e os saberes docentes (SD).
METODOLOGIA
Esta investigação é uma pesquisa social, de abordagem qualitativa (Minayo, 1999), do tipo ação (Thiollent, 2004), por meio de uma metodologia colaborativa (Bezerra, 2007; Gomes, 2009).
Os colaboradores da pesquisa
Os colaboradores da pesquisa se identificaram como sendo os PFI do curso de graduação em EF – Licenciatura Plena da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Para efeito de participação na investigação desenvolvemos a pesquisa com os professores que: a) estavam matriculados no componente curricular Prática de Ensino em Educação Física no semestre 01/2011; b) realizaram a sua intervenção prática em escola pública municipal da cidade de João Pessoa – PB; c) desenvolveram esta intervenção no Ensino Fundamental I.
Por outro lado, não adotamos como colaboradores da pesquisa os PFI que: a) já haviam atuado em escola como professor antes da realização do estágio supervisionado; b) já tinham adquirido mais de um ano de experiência docente como professor de escola; c) dispunham de outro curso de Magistério e/ou Licenciatura; d) realizaram a sua intervenção prática em escola de caráter privado.
Seguindo estes critérios obtivemos três PFI, dois do sexo feminino e um do sexo masculino. Acompanhamos as aulas no ambiente escolar e coletamos informações destes três PFI que aqui passam a ser representados pelos nomes fictícios de Luiza, Madalena e João. Luiza ministrando aulas no 1º ano, Madalena realizando o seu estágio com a turma do 2º ano, e João fazendo as suas aulas com a turma do 3º ano, todos do ensino fundamental I.
Técnicas para coleta de dados
Para identificar a prática pedagógica dos PFI durante o estágio supervisionado, as técnicas que utilizamos para a coleta de dados foram correlacionadas aos procedimentos apontados na metodologia colaborativa (Bezerra, 2007; Gomes, 2009).
Neste sentido, utilizou-se de três diferentes técnicas mediadoras de coleta de dados. Estas técnicas foram: a) Observação Participante (OP), com descrição de comportamento em diário de campo; b) Realização de Grupos Focais (GF), com perguntas abertas; c) Documentos Escritos (DE), pelos PFI, mais especificamente o memorial descritivo, a narrativa de formação e as sessões reflexivas.
Se estabeleceu, portanto, uma relação interativa entre as três técnicas utilizadas. Esta triangulação permitiu o aprofundamento das discussões e análise crítica de elementos constitutivos das aulas ministradas por parte dos PFI. A ligação entre as três técnicas afastou a ideia de isolamento de cada uma delas. Esta articulação ocasionou um sentido de complementaridade e ajuste entre todas. Os procedimentos feitos para a operacionalização desta triangulação e, por conseguinte, para a efetiva coleta de dados, é o que passamos a descrever, a seguir:
Procedimentos metodológicos para coleta de dados
A pesquisa teve a duração de aproximadamente três meses e foi realizada em uma escola pública da cidade de João Pessoa – PB. Este tempo de execução da pesquisa foi inter-relacionado às exigências mínimas da carga horária do componente curricular Prática de Ensino em Educação Física. O componente acontece no sexto período do curso de Graduação em Educação Física da UFPB e tem uma carga horária de 150h. Deste tempo total, os alunos matriculados (PFI) necessitam realizar um período não inferior a 100h de vivência docente no estágio.
Para isto, o processo metodológico de coleta de dados foi estruturado em duas dimensões. Estas dimensões definiram-se como sendo macro e micro estruturantes e percorreram toda a ação investigativa. A dimensão macroestrutural foi composta de sete fases e teve um caráter longitudinal. A dimensão micro estrutural aconteceu dentro de cada dia de intervenção no estágio e assumiu características transversais. Na dimensão longitudinal as sete fases foram: i) seminários temáticos; ii) reconhecimento do campo do estágio; iii) 1ª sessão reflexiva; iv) aulas laboratório; v) 2ª sessão reflexiva; vi) aula laboratório; vii) 3ª sessão reflexiva.
Na dimensão transversal, cada aula ministrada seguia o tempo de 40 minutos de duração. Os PFI ministravam cada um deles uma aula. O tempo deles no estágio iniciava às 13h e terminava às 17h. No transcorrer destas 4h, eles ministravam uma aula cada um e observavam as aulas de no mínimo outros três colegas. No nosso caso, para efeito de coleta de dados, a cada aula ministrada fazíamos uma observação participativa descritiva. Procuramos, durante a observação, ater-nos a descrever a aula e, por conseguinte, as ações instrutivas do PFI que estava sendo observado, conforme elas realmente aconteciam.
Estas observações descritivas foram direcionadas mais especificamente sobre a dimensão da instrução (Onofre, 1995) e seguiram 5 indicadores de análise (Quadro 1).
Quadro 1. Indicadores de observação das aulas.
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Dimensão |
Indicadores |
O que observar? |
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Instrução |
Atenção |
Como o PFI faz para garantir a atenção dos alunos durante o momento em que realiza a informação. |
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Dúvidas |
O que o PFI faz para garantir que os alunos fiquem sem dúvidas sobre as atividades que realizam em aula. |
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Tempo |
As ações que o PFI faz para minimizar o tempo que perde em informação em sala de aula. |
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Sentimento |
As atitudes dos professores para garantir que os alunos sintam que aprendem coisas importantes para eles. |
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Interesse |
Os comportamentos do PFI para garantir um nível elevado de empenho dos alunos na realização da atividade. |
Fonte: adaptado de Onofre, 1995.
Logo após todas as aulas serem ministradas aconteciam os Grupos Focais (GF). Os GF eram sempre iniciados com um questionamento que levava os PFI a fazerem um pequeno relato sobre as suas aulas e suas ações. Este era um primeiro momento de colocá-los para pensar sobre o que fizeram e de levá-los a refletir sobre a aula. Após este tempo de relato reflexivo (avaliativo, transformador e não diretivo), os outros PFI manifestavam suas opiniões em relação à aula observada e sobre os apontamentos feitos pelo próprio PFI. Todos os envolvidos no GF, a partir de então se postavam em constante diálogo. Estes diálogos se seguiam na busca de ajustes, na apresentação de opiniões contrárias ou convergentes, nas manifestações de inquietações em relação às dificuldades da turma, entre outras revelações. Para finalizar o GF, buscamos sempre estabelecer as discussões firmadas a uma possível continuidade com a próxima aula, de conseguir melhorar o desempenho dos docentes no próximo encontro com a turma.
No decorrer deste período do estágio conseguimos observar e registrar um total de oito aulas de cada um destes PFI, perfazendo, portanto, um total de 24 aulas observadas e registradas para efeito de colega e posterior análise de dados.
Realizamos a coleta de dados em três etapas. Estas etapas foram: a) antes do início das aulas do estágio, com a coleta do memorial descritivo e da narrativa de formação; b) durante a realização das aulas do estágio, com a coleta das sessões reflexivas 1 e 2, das observações participantes com registros dos comportamentos em diário de campo, da gravação de áudio das aulas laboratório e da realização dos grupos focais também com a gravação de áudio; c) após o término das aulas do estágio com a coleta da sessão reflexiva 3.
Todo este material construído foi coletado junto a Luiza, Madalena e João. Para fins de tratamento e análise das informações coletadas, todas as falas realizadas, tanto nas aulas como no GF, foram transcritas. Após a transcrição, estas falas foram devolvidas a Luiza, Madalena e João para autorizarem a sua publicação. O projeto foi aprovado junto ao comitê de ética da UFPB pelo protocolo nº 032/2011.
Tratamento e análise dos dados
Para análise e tratamento dos dados coletados foi adotada a proposta de análise de conteúdo de Bardin (2008). As análises seguiram um roteiro didático (adaptado de Souza, Melo & Santiago, 2010) e foram organizadas em torno de três fases distintas: a) a pré-análise, que ficou relacionada à organização dos documentos; b) a exploração do material, que ficou direcionado à codificação dos textos/ mensagens (recorte, enumeração e classificação); c) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação, que permitem estabelecer sentidos e significados às mensagens analisadas. Conjuntamente a esta elaboração, também foram estabelecidos os critérios de análise.
Para que as apreciações pudessem acontecer foi utilizada a técnica de análise de conteúdo do tipo categorial por temática. Estas categorias, em um segundo nível de aprofundamento, foram estruturadas em unidades de contexto e de registro. Esta análise possibilitou a identificação da pratica pedagógica dos PFI, sinalizações com a TD e os SD, assim como também, o reconhecimento das estratégias de ação e das formas de TD presentes na ação dos PFI. Para conseguir avaliar estas falas, escritas e os registros da observação participante, a análise foi realizada a partir da teoria dos SD e formação profissional de Tardif (2008), em interlocução com a teoria da TD de Chevallard (1998).
Pelo fato de buscar analisar o processo de TD dos saberes a ensinar dentro de um ambiente de formação de professores, isto trouxe alguns impactos sobre os resultados da investigação. Estes envolvimentos se manifestaram mais efetivamente nas categorias temáticas (CT) que compuseram os indicadores para a análise dos dados.
Estes indicadores se desenharam no conjunto de alguns elementos, dentre os quais a temática central da investigação, sua forma de operacionalização, seu objeto de estudo, sua questão norteadora e seus objetivos, geral e específicos. Nesta configuração, as CT apresentaram diferentes níveis e desdobramentos. Estes avanços sobre as CT compuseram os elementos de análise dos dados que foram coletados por meio das falas, escritas e observações.
De acordo com as análises iniciais realizadas e com as delimitações do estudo, duas foram as CT elaboradas. Estas CT marcaram um primeiro nível de composição de análise. A primeira CT se configurou acerca do tema formativo, ou seja, nas categorias que compõem a formação do PFI, ainda que encontrando aproximações com a TD. A segunda CT se concentrou na temática da aplicação e se configurou na análise da TD em ação, ou seja, do seu funcionamento e aplicabilidade.
Dentro de um segundo nível de composição, estas CT apresentaram outros temas estruturantes. Estes elementos de composição, neste nível, se fixaram no primeiro desdobramento acerca dos dados analisados. Na categoria formativa, tivemos três temáticas estruturantes, a saber: a) o componente curricular (o estágio supervisionado e sua afinidade com o processo metodológico); b) os saberes para ensinar; e c) os saberes a ensinar. Por outro lado, na categoria de aplicação analisamos a temática acerca do sistema didático no seu funcionamento stricto sensu. Todo este processo com seus indicadores e CT pode ser visto no quadro 2 a seguir, que representa um recorte do mapa estruturante de análise dos dados.
Neste estudo concentramos a apresentação do mapa estruturante, assim como dos achados da investigação, acerca da CT formação. Mais especificamente, vamos fazer esta descrição dos resultados encontrados sobre a categoria do componente curricular. Partindo dos indicadores, com suas CT nos seus dois níveis e seu primeiro desdobramento, é que fomos encontrar as unidades de contexto (compreensão) e as unidades de registro (significação), conforme Bardin (2008). Estas unidades que foram catalogadas se caracterizaram respectivamente como sendo um segundo e terceiro desdobramentos dentro do processo de análise dos dados. Estes desdobramentos nos permitiram encontrar os achados da investigação. Achados estes que passamos a descrever a seguir.
Quadro 2. Recorte do Mapa estruturante da análise dos dados.
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Indicadores |
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Elemento Central |
Operacionalização |
Objeto de estudo |
Questão norteadora |
Objetivo geral |
Objetivos específicos |
Categorias temáticas (1º nível) |
Categorias temáticas (2º nível) (1º desdobramento) |
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Manipulação do saber a ser ensinado: trato do conhecimento em sala de aula |
Formas operativas dadas ao saber que se define como saber a ser ensinado na escola |
Transposição didática como saber do professor em formação inicial |
Como ocorre a Transposição didática sobre os saberes a ensinar na prática pedagógica dos PFI no estágio supervisionado em EF? |
Analisar como os PFI, alunos do 6º período do curso de Educação Física, trabalham com a transposição didática dos saberes a serem ensinados durante o estágio supervisionado |
(Re) conhecer os elementos que sustentam a prática pedagógica dos PFI na realização da TD dos saberes a ensinar |
Formativas |
Componente curricular (estágio supervisionado) |
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Estabelecer relações entre estes elementos constitutivos para compreender a prática pedagógica dos PFI. |
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RESULTADOS
A unidade de contexto (UC) identificada, sobre as falas, escritas e observações dos PFI foi a prática pedagógica. Uma unidade detectada que se caracterizou arrolada ao processo metodológico colaborativo do estágio supervisionado e incidiu sobre a atuação destes professores.
A proximidade desta atuação com a metodologia colaborativa nos possibilitou então, como desdobramento desta UC, a identificação de três unidades de registro (UR). Estas UR recaíram em torno dos seguintes elementos: a) elemento da reflexão, que se manifestou nas ações dos PFI; b) elemento da observação, que evidenciou as percepções percebidas; e c) elemento de discussão no Grupo Focal, que assumiu um papel central de discussão e suporte dos dois primeiros e que, portanto, concentra a apresentação dos resultados.
Podemos visualizar estas impressões na escrita de Luiza que apresentamos a seguir:
Enfim, as minhas atitudes e metodologia melhoraram graças aos grupos focais, as minhas aulas foram muito proveitosas e divertidas tanto para mim quanto para os meus alunos. [...] Saio da escola [...] me sentindo uma professora de verdade, pronta para os desafios que me serão designados (Luiza, 3ª sessão reflexiva).
Uma vez que os PFI reconhecem a relevância do GF e como consequência a melhora da sua intervenção prática, ele, de certa forma assume esse papel centralização. Neste sentido, o que passa a ser observado e vivenciado nas aulas acaba sendo discutido no GF. O GF passou então a absorver estas impressões e ser um momento de auxílio e ajuda efetiva à prática dos PFI. Vejamos o que nos dizem João e Luiza a este respeito.
Outra preocupação minha era na questão da explicação da atividade e no que quero trabalhar na aula, pois estava sentindo dificuldades dos alunos entenderem o que eu queria, e isso me trazia alguns atrasados durante a realização das atividades para explicá-los novamente. Então no grupo focal levantei esta questão e [o supervisor] me deu a dica de tentar explicar a atividade se baseando já diretamente no objetivo específico para aquela aula. A partir daí, percebi um melhor entendimento dos alunos e também adotei o reforço da aula passada para eles, para que dessa forma eles peguem um gancho e já associem com a aula (João, 2ª sessão reflexiva).
Nesta reta final, utilizei os mesmos métodos das minhas dez primeiras aulas, mas com alguns ajustes. O grupo focal nos ajuda muito a fazer com que possamos refletir melhor e poder ajustar nossa metodologia, nosso tom de voz; podemos, através das observações dos colegas, visualizar suas aulas e trazer para nós o que há de soluções para nossa aula, podemos sugerir, acrescentar ver/dizer o que houve de errado. Isso faz com que haja uma melhora de forma geral em nosso conteúdo gerando uma aula muito mais proveitosa (Luiza, 3ª sessão reflexiva).
A realização do GF se tornou um ambiente altamente interativo, de significativas trocas de experiências. Elas ocorreram em torno dos saberes, das estratégias de ensino, da metodologia de ensino, da proposta pedagógica e das permanências, motivações e possíveis manifestações de desilusão da prática.
Nesta conjuntura, o GF, por meio das discussões que nele eram feitas, se caracterizou como sendo uma espécie de núcleo articulador da prática pedagógica dos PFI. Ele se configurou como suporte a esta prática docente. Isto visto que foi no GF e a partir dele que as observações e as reflexões se materializavam, passavam a ser publicadas e verbalizadas e, portanto, ganhavam forma e conteúdo.
Nesta estruturação, as discussões que eram realizadas no GF terminaram, então, assumindo um papel ativo-transformador da prática pedagógica dos PFI. Na complementação deste papel, estas discussões realizadas puderam também regular os outros dois elementos (observação e reflexão) que constituíram a ação docente deles.
Neste sentido, ao se fazer o cruzamento analítico entre as reflexões e as observações, conjuntamente ao local aonde foram manifestadas e publicadas, ou seja, a partir das discussões realizadas no GF, isto nos sinalizou três implicações à prática pedagógica dos PFI. Implicações estas que emergiram destas discussões realizadas no GF, tendo em vista a sua função articuladora (entre as reflexões e as observações) dentro dessa matriz estruturante da prática.
A primeira implicação pensamos fazer referência à suposta condição de abandono que os PFI podem sentir quando se deparam com a prática no contexto real de intervenção. Em um momento tão importante da formação inicial, em muitos casos, esta prática pedagógica dos PFI é desassistida e, na maioria das vezes, pouco refletida. As falas referentes a relevância do grupo focal nos passam a ideia da importância da coletividade, do quanto os PFI se fortalecem e se constroem professores quando junto a seus colegas, quando dividem angústias, conquistas e motivações. Estas falas nos evidenciam o quanto os PFI aprendem uns com os outros. Elas denotam assim uma aversão a um suposto isolamento do docente acerca da sua prática.
A segunda implicação diz respeito à importância da reflexão sobre a experiência prática. Os PFI, ao refletirem sobre as suas ações, sejam elas por meio de observações ou das discussões no grupo focal, constroem conhecimentos mais palpáveis e próximos do que acontece no contexto real. Esta construção pode vir a ser materializada pelo ato reflexivo do professor. Ato este que pode trazer indícios da transferibilidade dos saberes da formação para os saberes de aplicação no contexto real. Transferibilidade que pode abrir relações com a Transposição Didática.
Todavia, é ainda sobre este sentido que incide a terceira implicação, que atravessa todo este caminho formativo presente na prática pedagógica dos PFI. Parece surgir, desta forma, no transcorrer de todo este percurso prático-formativo, o que denominamos de cultura reflexiva do PFI sobre a sua prática. O docente acaba fazendo da reflexão um habitus na sua ação. Este ato de refletir se torna permanente, ativo e corriqueiro dentro do agir do professor. Ele passa a fazer parte da sua rotina em sala de aula. Vejamos a escrita de João a seguir:
Em todo tempo não me acostumei a ser o mesmo, pois [o supervisor] sempre me incentivava a refletir e melhorar cada vez mais, nunca se acomodando, mesmo nos dias em que nada de errado acontecia. Sempre estava refletindo em que poderia melhorar e no que poderia fazer para deixar os alunos mais satisfeitos ainda com a minha aula. Portanto creio que graças às pessoas que me cercaram e as observações e grupos focais, que foram de extrema importância, eu pude evoluir muito durante o estágio e descobrir essa paixão que tenho de ser professor. E não há satisfação maior para mim que ganhar um abraço e um sorriso de um aluno (João, sessão reflexiva – auto avaliação).
Esta conduta reflexiva permanente, estimulada no grupo focal pode transformar o saber-fazer do PFI, assim como suas relações com os saberes, com os alunos e com a cultura escolar. Todavia, quando esta cultura reflexiva começa efetivamente a fazer parte do hábito do PFI, tal qual entendemos, isto nos sinaliza para uma prática pedagógica com alta tendência reflexiva. A reflexão aparece conjuntamente a todas as instâncias de atuação do docente. De certa forma, esta situação nos sinaliza para uma intervenção repleta de saberes docentes.
DISCUSSÃO
As discussões no GF se transformaram no elemento central que constituiu a prática pedagógica dos PFI. Elas assumiram uma característica mais nuclear dentro de uma matriz constituinte da prática pedagógica dos PFI. Isto visto que eram nestas discussões que eles acabavam materializando e publicando as observações e as reflexões feitas, a partir da prática, pela prática e com a prática.
As discussões que foram realizadas no GF sinalizaram algumas contribuições à formação dos PFI. Estas contribuições vieram pelo procedimento ter se mostrado adequado à resolução dos problemas enfrentados a partir das falas e escritas dos próprios PFI apresentadas nos resultados. Este apontamento nos aproximam dos estudos de Soares, Reale & Brites (2000), quando estes obtiveram as mesmas leituras da relevância do GF. Neste estudo os investigadores também creditaram os resultados encontrados a esta manutenção e adequação do grupo e das discussões que nele eram firmadas.
A partir desta constatação, abrimos a possibilidade de dois pontos de análise. O primeiro deles incide sobre a verbalização dos sentimentos vividos, refletidos e observados no ambiente do GF. Esta verbalização colocou os PFI na condição de conseguirem explicar o que fizeram, o que observaram e o que refletiram. As discussões feitas, portanto, ganharam um sentido declarativo.
Este procedimento de manifestar opiniões, contrapor ideias e realizar afirmações possibilitou nos PFI o desenvolvimento de um conhecimento declarativo sobre o seu ofício. Esta situação já os coloca na condição de não mais somente saber fazer a aula, mas também de saber explicar o que fez e como fez. Aliás, no campo da EF isto é um dos desejos apontados por Freire & Scaglia (2009), de que os professores em particular e o componente curricular como um todo, não mais “engasguem” diante do questionamento sobre o que podemos ensinar. Nas palavras dos autores, “os professores sentem muita dificuldade em responder perguntas como: o que a Educação Física ensina no primeiro ano (ou no segundo)” (Freire & Scaglia, 2009, p.38).
Ainda que a citação acima levante outro ponto nevrálgico da área da EF (a sistematização do conhecimento ao longo dos anos escolares), ela provoca os docentes a conseguirem declarar o que ensinam. Isto implica em falar sobre os objetivos da aula, o comportamento dos alunos, as tarefas realizadas, os procedimentos adotados com seus acertos e desacertos, assim como o alcance dos resultados em termos de obtenção dos objetivos.
A estimulação deste conhecimento poderia aproximar, por exemplo, a distância que eventualmente separa os professores mais experientes dos que se encontram em formação inicial. Esse processo de relatar o ocorrido pode também trazer para e por meio do plano da consciência, elaborações mais consistentes sobre a prática pedagógica do PFI. Isto desencadearia análises mais maduras sobre o seu próprio agir docente.
No acompanhamento deste desenvolvimento do conhecimento declarativo do PFI se desencadeia o segundo ponto de análise. As discussões no GF passam, além de assumir este sentido declarativo, a adquirir um sentido integrativo. Este sentido se evidencia pelas próprias discussões estarem em constante convergência com as reflexões e as observações realizadas que passaram a ser declaradas, sejam elas antes, durante ou após a realização do GF.
Num desdobramento deste sentido integrativo, estas discussões feitas terminam por colocar o GF como o núcleo articulador da prática. Núcleo este que, de acordo com as escritas de João e Luiza, apontadas anteriormente (2ª e 3ª sessão reflexiva respectivamente), poderá manifestar pontos ou contrapontos em relação as suas ações docentes. Isto sempre acontecendo na correspondência com os elementos da observação e da reflexão trazidas e feitas por eles mesmos.
Nesta dimensão integrativa, se a prática do PFI caminhar para um sentido de levá-lo ao abandono do estágio, as discussões feitas no GF poderão apresentar contrapontos que o levem a rever a sua posição assumida e reavaliá-la. Da mesma forma, podemos tomar como exemplo as ações dos docentes ou os saberes a serem ensinados. Quando os PFI traziam as inquietações vividas e observadas em sala de aula para serem debatidas no GF, eles puderam encontrar pontos que os levavam a um reequilíbrio da sua prática.
Deste modo, as discussões permitiam ao PFI fazer uma revisão da sua ação docente. Portanto, este debate construído no GF possibilitava aos PFI a reavaliarem o próprio saber que estava sendo ensinado. Isto fica transparente, por exemplo, quando João relata que, a partir de um problema que levou para o GF, encontrou dicas que começou a adotar nas suas aulas e que, em consequência disto, levaram a melhorias no nível de compreensão dos seus alunos sobre o conteúdo ministrado (2ª sessão reflexiva).
Assim sendo, estas discussões integrativas provocam mudanças constantes no comportamento dos PFI. Estas transformações são acompanhadas pelo desejo de querer sempre melhorar as suas ações como docentes. Em consequência disto, os debates colocam os PFI num movimento de ida e vinda sobre as suas práticas. O que arranja sobre as suas ações pedagógicas um viés dinamizador.
As discussões neste segundo sentido vão possibilitar a integração entre os saberes docentes que estão na base da matriz com as reflexões e as observações, realizadas e declaradas. Desta forma, no momento em que integram estes saberes, opiniões, pontos de vista e os declararem, isto pode gerar certa consistência interna no agir docente dos PFI.
Esta consistência viria acompanhada pelo estabelecimento das ligações entre todos os conjuntos de saberes e elementos pertencentes a prática pedagógica dos PFI. Tomamos esta compreensão pela aproximação dos resultados aqui encontrados com os achados de Ressel et al. (2008) e Arboleda (2008). Os autores, ao utilizarem o GF nos seus estudos, apontaram que ele é um grande facilitador de abordagens e temas diversos, que por meio dele se desconstrói e reconstrói conceitos e ainda que permite aos participantes buscarem novas respostas para as suas inquietações.
Nas tensões geradas das inter-relações entre saberes, olhares e reflexões, as discussões firmadas caracterizaram o GF como sendo um espaço democrático e de construção coletiva. A sua descoberta como núcleo articulador desmembrou algumas implicações para esta prática pedagógica dos PFI.
De todas as articulações feitas a partir das discussões no GF, três delas foram as principais implicações evidenciadas. A primeira delas diz respeito à importância da coletividade que os PFI podem vivenciar durante o estágio. A discussão no GF leva, portanto, a uma coletividade. A segunda se estabeleceu na importância da reflexão sobre as experiências práticas, ou seja, o debate deixa em evidência a necessidade de refletir sobre, na e a partir da ação. E, por fim, a terceira implicação ficou acerca do surgimento de uma cultura reflexiva que acompanha a ação docente do PFI. Sendo assim, as discussões podem ajudar na construção de um hábito reflexivo no PFI.
Para o primeiro ponto de análise partimos do estudo já antes trazido por Ferreira (2002), quando relata que os PFI vão ao campo de estágio, na maioria das vezes, sozinhos e desassistidos. Este aparente abandono dos PFI quando na intervenção pode os deixar à margem do ser professor na coletividade. Esta situação entra em oposição a um processo de construção coletiva da ação docente. Esta implicação identificada a partir das discussões realizadas no GF sinaliza, portanto, para uma organização do trabalho pedagógico dos PFI construído na e a partir desta coletividade.
Esta construção se deu por meio das interações e trocas de experiências vivenciadas, refletidas e observadas. Neste sentido, os PFI aprenderam uns com os outros. Precisam estar disponíveis para o diálogo (Freire, 1996). Precisam estar abertos a viver tempos e espaços com os colegas de profissão para poderem trocar ideias e sentimentos.
É o diálogo que pode colocá-los em interação com seus pares. Pelo diálogo, os PFI podem afirmar posições assumidas, rever discursos feitos, compreender outros pontos de vista. Inclusive, por meio dele, ele pode descobrir-se contraditório e complexo, manifestar desejos de querer transformar os outros, transformando a si próprio. Para Freire (1996) e Perrenoud (1997), por exemplo, o processo de aprendizagem do docente não ocorre, ou não deveria ocorrer, pela individualização. O docente, em outras palavras, não aprende sozinho. O que neste sentido pode até mesmo pôr a coletividade vivida como auxiliadora na construção da identidade docente dos PFI.
Borges (1998), nos seus estudos, denominou esta construção coletiva feita a partir das discussões nos GF como grupos de referência. Grupos estes, na maioria das vezes, compostos por docentes, colegas de escola, que são criados para discutir, planejar, organizar as práticas pedagógicas dos professores, para eles tirarem dúvidas sobre assuntos vividos e tematizados em sala de aula. Todavia, no mesmo estudo, a autora faz uma importante ressalva quando relata que os docentes investigados tiveram dificuldades em estruturar estes grupos de acordo com o contexto de intervenção em que se encontravam. Isto denota, em um primeiro momento, que não são todos os docentes (sejam eles iniciantes ou não) que estão abertos a esta discussão com sentido integrativo. Num segundo momento, é pertinente reconhecer também que estes grupos de referência não serão constituídos em todos os ambientes educacionais.
Por outro lado, alguns estudos (Bosle & Molina, 2009; Girotto, 2005; Muños, 2004; Varani, 2008) têm sinalizado o quanto os professores avançam no seu saber ser e fazer a partir da organização e construção coletiva do seu trabalho pedagógico. O que aponta para um desejo de se buscar constantemente a sua estruturação nos ambientes de ensino. Isto provoca também o não isolamento do professor sobre a sua prática. Refletir sobre o vivido, o já experimentado ou o ainda a ser explorado, pode criar a necessidade de busca de espaços para discutir as reflexões provindas destes contextos.
Esta situação de refletir sobre a experiência rompe com a ideia do professor prático. Aquele docente que, segundo os estudos de Pérez (2000), alicerça o seu fazer no senso comum, que faz do seu ensino um processo de tentativa e erro, essencialmente conservador, impregnado de vícios e obstáculos epistemológicos em torno do saber de opinião. Esse docente constrói, portanto, uma “prática não-reflexiva, intuitiva e fortemente rotineira que se realiza no mundo privado da aula, isolado do restante dos colegas de profissão” (p.364).
A importância de refletir no conjunto da prática, além de colocar os docentes num caminho oposto deste professor prático, os possibilitaria aprender a ensinar reflexivamente, atingindo o domínio crítico desta reflexão. Inclusive esta foi uma fragilidade apontada nos estudos de Mateus, Gimenez, Ortenzi & Reis (2002) na atuação dos PFI.
O domínio crítico não viria desassistido de uma base teórico-epistemológica, nem tampouco de uma construção reflexiva exclusivamente individualizada. Por outro lado, foi do conjunto da coletividade e da reflexão crítica que apareceu a necessidade do desenvolvimento de uma cultura reflexiva no PFI, a adoção de uma permanente atitude reflexiva que acompanhasse o docente nos diversos momentos vividos durante a sua trajetória enquanto professor. As seguidas discussões no GF corroboraram no desenvolvimento deste processo de colocar o docente a refletir constantemente sobre a sua prática.
Sendo assim, a reflexão fundamentada, construída e declarada nas discussões coletivas começou a fazer parte do habitus da ação docente dos PFI. Os resultados apontam para este tipo de compreensão, o que permite sinalizar novamente a integralidade entre o professor reflexivo e pesquisador. Fizemos esta associação ancorados nos estudos de Becker & Marques (2010), quando afirmam que o hábito reflexivo será um dos indicadores que irá fazer com que o professor assuma sua dimensão investigativa, isto por que o “seu saber fazer irá se alimentar da dúvida, antes da certeza que, quando atingida, será sempre provisória” (p.8).
Neste sentido, outro ponto que passa a ser considerado diz respeito à continuação deste hábito reflexivo adquirido pelos PFI no e a partir do estágio. Fizemos este apontamento por nos aproximarmos dos estudos de Sanchotone & Molina (2006). Os autores conseguiram correlacionar a permanência em uma prática reflexiva em oposição a intensificação do trabalho docente. No estudo realizado pelos autores ficou sobressalente um suposto abandono do ato reflexivo do docente, no momento em que ele avança no seu fazer pedagógico ao longo dos anos de profissão e/ou quando assume funções dentro do contexto escolar. Há certa tendência de um esvaziamento reflexivo do professor. Esta situação nos faz perguntar até que ponto os PFI se manteriam dentro deste estado de reflexão, dentro desta cultura reflexiva, que desenvolveram quando do percurso do estágio após a sua finalização.
Por hora, pensamos que assim como Chevallard (1998), no âmbito do ensino dos saberes, propôs uma vigilância epistemológica em torno do saber que será ensinado, poderíamos pensar em uma vigilância crítico-reflexiva do docente sobre a sua atuação. De os PFI conseguirem desenvolver dispositivos para conseguirem se manter atentos e preocupados com os seus hábitos reflexivos, principalmente sobre os saberes para ensinar e a serem ensinados.
CONCLUSÃO
A análise do elemento discussões no GF apontou para um sentido declarativo e outro integrador dentro da prática pedagógica dos PFI. No interior deste ambiente de debate, as discussões permitiram ofertar uma consistência interna à ação pedagógica dos PFI, como também assumiram uma função articuladora dentro de uma matriz constituída para a prática pedagógica.
Esta função atribuída às discussões no GF, além de sincronizar os elementos com os saberes docentes, terminou por colocar em evidência três importantes implicações à prática pedagógica dos PFI: a coletividade, a reflexão que desencadeia a ação, e a permanência do estado reflexivo.
A transposição didática aconteceria a partir das discussões realizadas nos grupos focais, pois é nele que o PFI consegue ações que visam o reequilíbrio da sua prática. Esse ajuste passa inevitavelmente por discutir os conteúdos que estão sendo ensinados, ou seja, o próprio saber a ensinar, suas formas e metodologias de ensino.
O diálogo aberto realizado no grupo focal permitiu que os assuntos ali abordados se convertessem em temas geradores. O aprofundamento destes temas deu um sentido mais amplo para o próprio grupo focal, o transformando em um elemento central da prática acerca da manipulação do saber a ensinar.
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