PONENCIAS

 

O método da cartografia: conhecer e cuidar de processos singulares

 

El método de la cartografía: conocer y cuidar de los procesos singulares

The method of cartography: knowing and caring of singulars processes

 

 

Tadeu de Paula Souza1

1 Doctor en salud colectiva, Universidad Estatal de Campinas, Magíster en psicología, Universidad Federal Fluminense, Psicólogo, Universidad Federal Fluminense. Ministerio de Salud y Universidad Estatal de Campinas, Brasil. Correo electrónico: tadeudepaula@gmail.com

 

 

Recibido: 10 de mayo de 2015. Aprobado: 20 de junio de 2015. Publicado: 20 de octubre de 2015


Paula–Souza T. O método da cartografia: conhecer e cuidar de processos singulares. Rev. Fac. Nac. Salud Pública 2015; 33(3): S72–S80. DOI: 10.17533/udea.rfnsp.v33s1a12


 

RESUMO

A constituição da cartografia enquanto método de pesquisa qualitativa vem sendo um movimento emergente no Brasil que envolve pesquisadores de diversos campos do conhecimento: educação, saúde, estudos da cognição, artes, urbanismo, dentre outros. Neste artigo apresentaremos e discutiremos o desafio de consolidação de um método que não se pretende como um conjunto de regras predeterminadas, mas que se pretende uma ética, uma estética e uma política de produção do conhecimento. Tomaremos como um importante problema para a produção do conhecimento aspectos que consolidaram o paradigma cientificista, em especial os processos que produziram uma desvalorização da dimensão singular da realidade e uma desvalorização do cuidado como condições para o conhecimento. A partir da metodologia da análise de implicação exploraremos como a cartografia se compromete em produzir uma reconciliação do conhecimento com a singularidade e com a ética do cuidado, bem como as implicações metodológicas e os efeitos dessas implicações para a produção do conhecimento.

Palavras–chave: Cartografia, conhecimento, cuidado e singularidade


RESUMEN

La constitución de la cartografía como método de investigación cualitativa ha sido un movimiento emergente en Brasil en el cual han participado investigadores de diversos campos del conocimiento: educación, salud, estudios de la cognición, las artes, el urbanismo, entre otros. En este trabajo se presentan y discuten el desafío de consolidar un método que no se piensa como un conjunto de reglas predeterminadas, sino que pretende ser una ética, una estética y una política de producción de conocimiento. Suponemos que algunos aspectos que consolidaron el paradigma del cientificismo plantean un problema importante para la producción de conocimiento, en especial los procesos que produjeron la devaluación de la dimensión singular de la realidad y la devaluación del cuidado como condiciones para el conocimiento. A partir de la metodología de análisis de la implicación, exploraremos cómo la cartografía se ha comprometido a generar la reconciliación de los conocimientos con la singularidad y con la ética del cuidado, así como las implicaciones metodológicas y los efectos resultantes para la producción de conocimiento.

Palabras clave: Cartografia, conocimiento, cuidado, singularidad


Abstract

The constitution of cartography as a method of qualitative research has been an emerging movement in Brazil that involves researchers from various fields of knowledge: education, health, cognition studies, arts, urban planning, among others. In this paper we present and discuss the challenge of consolidating a method that is not intended as a set of predetermined rules, but instead is intended to be an ethics, an aesthetics and a knowledge production policy. We will adopt that some aspects that consolidated the paradigm of scientism are a major problem for the production of knowledge, especially the processes that produced both the devaluation of the singular dimension of reality and the devaluation of care as conditions for knowledge. Starting from the methodology of analysis of implication, we will explore how cartography is committed to engender the reconciliation of knowledge with the singularity and with the ethics of care, as well as the methodological implications and the resulting effects for the production of knowledge.

Key words: Cartography, knowing, caring e singularity


 

 

Introdução: uma breve cartografia da cartografia no Brasil

Inspirados, principalmente, pelo pensamento de Deleuze e Guattari, diversos pesquisadores no Brasil vêm se dedicando à formulação do método da cartografia [1]. Cartografia foi um termo utilizado por Deleuze e Guatarri no livro Mil Platôs para designar uma aposta de escrita e pensamento rizomático e de acompanhamento da produção de desejo integrado a territórios existenciais. O mais profundo é a pele, pois na superfície do contemporâneo se expressam todas as batalhas históricas. Cartografia seria este exercício do pensamento de acompanhar trajetos e devires de diferentes vetores que constituem as distintas realidades. Essa inspiração, que teve seu nascedouro, no movimento contracultural francês surge com o difícil desafio de não se afirmar como um conjunto de regras que delimita um campo fechado e identitário. Podemos afirmar que o pensamento de Deleuze e Guattari é um pensamento acerca da diferença, da heterogeneidade, da multiplicidade e da singularidade, em uma nítida atitude de repúdio aos universais. Como, então, propor um método em pesquisa que não se apresente a partir de regras definidas a priori, universalmente válidas?

Um importante marco da formulação acerca da cartografia no Brasil foi a visita de Felix Guattari no início da década de 80 a convite de Suely Rolnik, professora da Pontifícia Universidade Católica [2]. As discussões a respeito da produção de subjetividade e modulações do capitalismo mundial integrado ganhavam contornos intensos no cenário de abertura política no Brasil, na década de 80, após vinte anos de governo militar. Guattari e Rolnik fizeram uma primeira aventura de cartografar o território político, social e subjetivo em terras brasileiras, tomando como fio condutor e perspectiva de análise os movimentos de resistência emergentes: movimento gay, movimento feminista, movimento dos operários na fundação do Partido dos Trabalhadores, dentre outros.

A vinda de Felix Guattari ao Brasil, e seu encontro com Suely Rolnik e o mapeamento das forças micropolíticas que se mobilizavam no Brasil em tempos de abertura política, resultou na publicação do livro Micropolítica. Cartografias do Desejo [2]. Anos mais tarde, Rolnik defende sua tese intitulada Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo [3]. Desde então diversos grupos em diferentes universidades no Brasil vêm se apropriando desta perspectiva metodológica em diversos campos, inclusive no campo da saúde coletiva.

Uma importante produção que demarca a perspectiva da cartografia enquanto um método de pesquisa foi o livro Pistas do Método da Cartografia: pesquisaintervenção e produção de subjetividade[4]. publicado em 2009. Até então a cartografia comparecia como uma perspectiva, uma abordagem, um modo de pensar, uma corrente filosófica, mas não exatamente um método de pesquisa qualitativa. Inquietos com o paradigma cientificista vigente e inspirados por um pensamento que se afirma enquanto um paradigma ético, estético e político de produção de conhecimento, pesquisadores se reuniram durante três anos para formular pistas do método cartográfico. A ideia de pistas foi uma estratégia para a formulação do método cartográfico, em que a consistência do método se apresenta a partir de indicações que demarcam como um caminho foi percorrido e menos uma regra que antecede o caminhar e define como todos devem percorrer um caminho. Daí a inversão do sentido tradicional de método – metá (finalidade) – hódos (caminho) – em que a pesquisa é definida como um caminho predeterminado pelas regras dadas a priori. Ao invés de metá–hódos (método), a cartografia propõe, enquanto uma atitude transgressora, um hódos–metá, um primado no caminhar em relação à meta. Assim, uma pista comporta necessariamente uma abertura à criação de outras pistas. Uma pista é uma oferta que não se fecha às singularidades e imprevisibilidades do caminho, porque entende que cada caminho é singular. Desse modo, uma pista evoca a produção de conhecimento baseado menos na necessidade de produzir certezas e mais na necessidade de produzir confiança.

A ideia de pista será tomada aqui como uma pista sobre o desafio da produção do conhecimento de processos singulares não universais. Ao invés de me debruçar sobre uma determinada pista ou de formular uma nova pista, quero, a partir dessa explanação inicial, destacar o que se apresenta como um dos grandes desafios posto às pesquisas qualitativas em geral, e para o qual a cartografia se dedica a criar caminhos possíveis. A ideia de pista aponta para duas necessidades intrínsecas: de que todo caminhar comporta processos singulares e de singularização, e que para apreender tal processo é necessário produzir um conhecimento que não se baseia em certezas universais, mas em produzir confiança no caminhar, ou seja, é necessário cuidar para se conhecer. Confiança entendida menos como um estado emocional pré–existente aos encontros, mas como um estado afetivo que emerge de uma atitude de fiar com (com–fiar), fazer junto, co–produzir, sendo este estado não o de uma suposta harmonia, mas de uma tensão criativa, um cuidado com o fazer coletivo. Tema muito mais caro às pesquisas qualitativas em saúde, uma vez que o cuidado é parte constitutiva do campo da saúde. Uma pista condensa o que se apresenta como um grande problema posto à produção do conhecimento dito qualitativo: qual a validade e como se produz um conhecimento do que é singular e que, portanto, não se propõe a ser uma verdade universal?Que dinâmica podemos estabelecer para a produção de conhecimento de regimes de sensibilidades, experiências singulares, visões de mundo, ou seja, do conhecimento sobre a dimensão qualitativa e singular da realidade?

O divórcio entre conhecimento e singularidade e o divórcio entre conhecimento e cuidado

Tomaremos dois momentos que custaram muito caro à produção de conhecimento: o período socrático e o período cartesiano. Certamente muitos outros períodos se somam a estes na construção de uma hegemonia do paradigma científico, mas destacamos estes dois, pois tratam de dois aspectos caros à cartografia: singularidade e cuidado.

O período socrático produziu uma primeira cisão no pensamento, a cisão entre conhecimento e singularidade, a partir da defesa de que o conhecimento verdadeiro é o conhecimento do que é universal. Uma possibilidade para se pensar os sentidos de universalidade foi aberta pelo eminente filósofo François Jullie através de estudos em que se arvora a uma árdua genealogia do conceito de universalidade [5]. Sem pretender esgotar a temática, o autor indica três bases constitutivas dos sentidos de universalidade: a filosofia, a política e a religião. Segundo o autor, estes três sentidos são frutos de “três impulsos” da história humana que não têm uma relação intrínseca entre si e que, portanto, carregam consigo matérias díspares. A matéria da filosofia é o conhecimento, sendo sua tarefa a definição de conceitos universais que conduzem ao conhecimento verdadeiro. A matéria da política é a cidadania, sendo sua tarefa a definição legal de direitos universais. E por último, a matéria da religião é a fé, sendo sua tarefa levar à salvação universal.

Uma genealogia não busca identificar uma relação de filiação entre estes três terrenos, sob a qual se traçaria uma linearidade do conceito. Trata–se de um percurso nebuloso, feito de ziguezagues, zonas de vizinhança e arestas instransponíveis. Como em toda boa genealogia, são destacados momentos em que terrenos com formações históricas distintas são unidos, não por uma natureza do conceito, mas por relações de poder que produzem agenciamentos entre práticas e regimes de verdade.

Três terrenos do universal, cada qual com sua lógica e pressões próprias: o conceito sob as exigências do logos corresponde às exigências próprias da ciência; a constituição da “cidadania universal” corresponde às exigências de expansão do império Romano, e a salvação como ponto de ancoragem entre o homem e o universal de Deus. O autor indica que, por estas clivagens, não há mesmo como compor uma “história” do universal, “mas apenas acumulação e concentração de exigências por superposição de camadas e estratificação de impulsos”. Entretanto, estas estratificações, apesar de descontínuas, não deixaram de servir de base sólida para a fundação do universal e sua ampla penetração na formação política e cognitiva do mundo ocidental. Não há porque desconfiar do universal, seja da sua operação para o pensamento, como para o direito, como para a alma. Ele surge como algo pronto e acabado. “Inclusive, apesar de sua composição heterogênea, o universal, vê–se projetado como pedra angular e aspiração única”.

Apesar de se tratar de três impulsos, nos dedicaremos ao primeiro deles, que constituiu o próprio conceito de universalidade e define uma clivagem entre duas escolas do pensamento: os pré e os pós–socráticos. Jullien analisa como que na história do pensamento, o universal – ou o conceito de universalidade – comparece como uma totalidade finalizada, pronto desde sempre, como Atenas que surge pronta da cabeça de Zeus [5]. O pensamento grego não só erigiu o universal como condição de acesso à verdade, como o fez de um modo que a aparição deste estivesse descolada de uma produção histórica, como um raio que vem das alturas iluminar o pensamento: um fiat lux. Para a filosofia, a universalidade surge como uma operação lógica – logos – na medida em que o acesso à verdade se dá pela possibilidade de afastamento das experiências como condição de apreensão do todo, de pensar e formular questões “segundo o todo” ou de forma universal. A universalidade convoca um afastamento do caos das sensações como exercício de elevação do pensamento e da razão. A aproximação entre verdade e universal foi a novidade do pensamento grego, mais precisamente a partir de Sócrates, que ao contrário dos seus antecessores, não faz do todo uma determinada coisa (água, ar, infinito), mas uma regra que determina a forma superior do pensamento. Ao ponto do acesso à universalidade ser o próprio exercício de elevação do pensamento, possibilitando ao homem passar da diversidade dos fenômenos para a unidade do conceito.

É como se o conceito de universal não correspondesse a uma página da história do pensamento, mas fosse, ele mesmo, a própria condição do pensamento. O universal, como nos atenta o autor, se institui como o conceito fundador do próprio ato de conhecer. Essa operação tira o pensamento da história e, portanto, o torna, na medida em que se afasta da experiência, universal e neutro. A universalidade, enquanto operação lógica se constitui a partir do divórcio e distanciamento das singularidades dos fenômenos.

Para os pré–socráticos, a relação homem–natureza não era mediada por instâncias invariantes. A célebre aporia de Heráclito, de que um homem não entra no mesmo rio duas vezes, traz de forma muito evidente uma outra relação entre pensamento e natureza. Para Heráclito não há “o homem”, enquanto categoria universalmente definida, assim como não há “o rio”, enquanto natureza fixa. Homem e rio são devires, são processos em transformação. Com Sócrates inaugura–se uma nova etapa da filosofia, que para alguns é definida como o início propriamente dito da filosofia, caracterizando os movimentos anteriores como pré–filosofia. Será esta tradição que irá fundar as bases para a ciência e para as escolas que buscam estruturas e regras invariantes do pensamento e do mundo. Para a tradição socrática, conhecemos não quando verificamos que o sol nasce todas as manhãs, mas quando julgamos que ele nascerá amanhã [6]. Para a tradição pré–socrática, julgar que o sol nascerá amanhã é uma faceta do conhecimento que não é superior à experiência singular de assistir a cada nascer do sol.

É importante destacar um instigante ponto de problematização sobre o universal: o ponto em que o universal é confrontado com outras culturas (não ocidentais). O filósofo faz as seguintes perguntas: “a preocupação com o universal, é por sua vez universal?Ou seria uma fantasia teórica, ainda que eminentemente produtiva, forjada de maneira exclusiva pelo Ocidente: logo espantosamente singular?” [5]. Apesar de dito universal, a pretensão de universalização do conhecimento e dos valores pertence ao mundo ocidental, às culturas sob influência da cultura greco–romana cristã.

Se por um lado coube ao período socrático realizar uma desvalorização do conhecimento sobre o singular e excluir os regimes de sensibilidade do campo do pensamento, por outro lado não coube a esse período o divórcio entre cuidar e conhecer. Embora o período socrático tenha produzido uma desvalorização do conhecimento das singularidades, tornando a diversidade da experiência vivida um empecilho para o conhecimento, paradoxalmente o pensamento socrático não fazia uma separação entre conhecer e cuidar.

As pesquisas de Foucault [7] apontam para uma outra importância dada ao preceito délfico do templo de Apolo: o “Conheça–te a ti mesmo”, para o qual Sócrates seria o principal porta voz. Na realidade, o preceito délfico que Sócrates proferia era “cuida–te a ti mesmo para que possas ter acesso ao conhecimento verdadeiro”. Ou seja, o conhecimento era subordinado ao exercício do cuidado, e o acesso ao conhecimento verdadeiro só era possível mediante a própria transformação, uma prática de si. O que importa aqui são menos as técnicas de cuidado e mais a inseparabilidade entre conhecer e cuidar, entre conhecer e transformar–se: uma ética do conhecimento.

A separação entre conhecimento e cuidado se processou na idade moderna, no período cartesiano, no momento em que se define que “o que permite aceder ao verdadeiro é o próprio conhecimento e somente ele. Isto é, no momento em que o filósofo, sem que mais nada lhe seja solicitado, sem que para isso tenha que se modificar enquanto sujeito, é capaz em si mesmo, e unicamente por seus atos de conhecimento, de reconhecer a verdade e a ele ter acesso”.

Mas, se pois, o conhecimento cartesiano, por razões bastante simples de compreender, requalificou o “conhecete a ti mesmo”, ao mesmo tempo muito contribuiu para desqualificar o princípio do cuidado de si, desqualificá–lo e excluí–lo do pensamento filosófico moderno [7].

O fato do conhecimento ser atribuído a faculdades transcendentais ao sujeito (estruturas formais) e o pesquisador ser aquele que acessa o que é universalmente válido, portanto além das meras sensações, afecções e singularidades, inseriu o pesquisador definitivamente na redoma da neutralidade. Em última instância, o discurso da neutralidade se tornou uma estratégia de neutralizar as forças do campo pesquisado que afetam, inevitavelmente, o pesquisador e maximizar a afetação das forças que a pesquisa produz sobre o campo pesquisado. Do auge do saber, aquele que conhece, supostamente não intervém sobre a realidade, ele desvela a verdade. O efeito gerado por essa suposta descoberta é, senão os efeitos da verdade, os efeitos da iluminação sobre o que estava obscuro. No paradigma da neutralidade, a intervenção que a pesquisa produz no mundo é valorada como uma intervenção neutra de intenções, ou seja, no limite essa intervenção é valorada como não intervenção, mas como efeito de verdade.

Do ponto de vista do sujeito do conhecimento, o efeito do acesso à verdade é nada mais do que o próprio conhecimento. O conhecimento pelo conhecimento. Mas, intrínseco à separação entre conhecimento e cuidado, operou–se e opera–se uma vontade de poder: conhecer é controlar e dominar a realidade conhecida.

No contemporâneo, o compromisso com a produção de conhecimento se volta para as reivindicações de movimentos minoritários e de luta por direitos às singularidades. Ao contrário da antiguidade que se produzia conhecimento para acessar a verdade e assim alcançar a iluminação, e da modernidade que agravou o descompromisso com o outro, e o conhecimento passou a visar o próprio conhecimento, no contemporâneo a produção de conhecimento precisa ter um compromisso com a transformação social a partir de um duplo compromisso: reconciliação entre a produção do conhecimento e as singularidades e o cuidado que deve acompanhar todo ato de conhecer.

A universalidade precisa ser posta em contato com figuras que nada lhe devem em termos de cobrança e consistência: como singularidade, alteridade e heterogeneidade. Como afirma Jullien [5]:

“Há de fato drama no pensamento europeu, uma vez que o universal tem como oposto, no seio do concreto, figuras que nada ficam a lhe dever em matéria de exigência: o individual e o singular ; logo, também é a partir desse contrário que lhe convém interrogá–lo”.

Uma questão lançada pelo autor, que permite conectarmos com os nossos problemas específicos da saúde, se abre quando este questiona se a universalidade teria o mesmo sentido e o mesmo valor quando não aplicada à razão e à ciência, mas sim ao campo das relações humanas e à vida. Trata–se de fazer emergir uma perspectiva do universal que se conecte às singularidades, com as diferenças e com o atual. Um universal que não se esquive das provas inelutáveis do conhecimento produzido com e a partir das experiências singulares e atento à diversidade de necessidades que o presente comporta. Esta perspectiva é definida por Jullien como uma rebelião contra o universal:

A história do universal, em contradição com a exigência do próprio universal, corresponde a uma aventura singular do pensamento que fundou as bases para a modernidade ocidental, como também seus impasses. O singular e o cuidado nos convocam a um duplo compromisso para a produção do conhecimento na perspectiva da cartografia a fim de explorar as implicações metodológicas que doravante decorrem.

Implicações metodológicas do duplo engajamento da cartografia: conhecer é acessar o singular e conhecer é cuidar – só acessamos o singular cuidando

Ética semelhante à ética grega foi a proposta pelos analistas institucionais franceses quando afirmam não como os gregos de que é preciso cuidar para conhecer, mas de que é necessário transformar para conhecer. Tomando esse exercício de transformação sempre em mão dupla: transformação de si e do mundo como um movimento criativo. Trata–se, portanto, de uma ética que não se separa de uma estética, uma estética de si. Daí a necessidade da cartografia ter como outro importante campo de referência as contribuições da Análise Institucional francesa, em especial a proposta da Pesquisa–Intervenção de René Lourau [8–9].

Para a Análise Institucional toda pesquisa é intervenção, cabendo ao pesquisador explicitar como a intervenção se produziu, tomando como ponto de partida a própria implicação do pesquisador. Como vimos, o discurso da neutralidade produziu uma linha de intervenção de mão única, a intervenção como efeito inevitável do acesso à verdade. No limite, a verdade que é transformadora, sendo esta transformação desejada e benéfica, uma vez que suas condições de acesso são imparciais. Os efeitos destrutivos dessa ética conduzem a humanidade a confrontar–se com os limites do próprio planeta, de tal mote que se torna urgente explicitar como o inevitável caráter interventivo de qualquer pesquisa se processa. Portanto, é necessário um modo de se apropriar da inevitável dimensão interventiva de todo ato de pesquisar, para produzir relações menos violentas e produzir menos apropriação por parte do pesquisador.

Partindo desse princípio ético, nada mais coerente do que partir do corpo do pesquisado como uma caixa de ressonância, ponto de inflexão ética de todo ato de produção de conhecimento: análise de implicação [8–10]. Sendo a análise de implicação a âncora da tripla aposta metodológica – aposta ético–metodológica: cartografar é cuidar de processos de singularização; aposta estéticometodológica: conhecer é transformar a si e o mundo (conhecer é criar); aposta político–metodológica: conhecimento é uma produção comum (do comum).

A análise de implicação insere o pesquisador de modo imediato no duplo engajamento: conhecer é cuidar de si e do mundo, tendo como objeto processos singulares. Eis então nossa primeira aposta: aposta éticometodológica. A recusa à neutralidade implica num engajamento cuidadoso, pois o que afeta o pesquisador é fundamental para a cartografia dos regimes de forças de um determinado território. Os regimes de forças compostos de diferentes vetores são, antes de tudo, regimes de afetação: afetar e ser afetado. A análise de implicação não conduz a uma análise do sujeito, não se conclui no sujeito, mas parte dos afetos e afecções que mobilizam o corpo do pesquisador para mapear um plano de forças. O corpo do pesquisado opera como uma caixa de ressonância do encontro de forças, de vetores e linhas de diferentes matrizes: vetores políticos, planetários, afetivos, históricos. Se tomarmos o sujeito pesquisador como um sujeito historicamente e politicamente constituído, analisar as implicações passa essencialmente por analisar, por um lado, como essas forças históricas e políticas nos atravessam e nos constituem e por outro, como elas se atualizam no mundo atual. O exercício de análise de implicação é necessariamente um exercício de análise de si e do mundo, ou de um si no mundo e de um mundo em si. Trata–se, portanto, de um cuidado de si e do mundo como condição para acessar o plano de forças que constituem sujeitos e objetos.

Ao mesmo tempo cabe notar que essa atitude é também condição para se acessar a dimensão singular da realidade. Ao contrário dos gregos, em que o cuidado era uma atitude de superação das ilusões do mundo das sensações para acessar o conhecimento universal e verdadeiro, a análise de implicação passa por um mergulho no mundo das sensações e dos regimes de afecção, não para acessar um conhecimento transcendental, mas para acessar o plano de constituição da realidade, um plano de imanência entre sujeito que conhece e mundo conhecido. A realidade, mesmo nas abordagens qualitativas, pode ser apreendida na sua dimensão de representação de estados de coisa. Interessa para essas abordagens apreender a regularidade dos fenômenos subjetivos e a normalidade das condutas numa pretensão cientificista. Capta–se desse modo somente a narrativa do instituído, de como os fenômenos são e como a realidade se apresenta. Rolnik [3] propôs uma distinção entre o olho retina e o olho vibratium, apontando que o olho retina capta o que nos é apresentado como natural, as formas constituídas, as representações. Para a cartografia interessa menos o que somos e mais o que estamos nos tornando, ou seja, a dimensão processual da realidade, em que esta variação de si é um indicador de um mundo que varia. A dimensão processual da realidade implica num exercício de ativação de um corpo vibratium ativação de um regime de sensibilidade e regimes de afetabilidade que a pesquisa instaura, uma atenção aos ritmos e intensidades. Afetamos e somos afetados durante o ato de pesquisar. O que nos afeta interessa na medida em que podemos, a partir da análise das nossas afetações, cartografar um campo problemático: análise de implicação.

Acessar a realidade na sua dimensão processual ou os processos de singularização exige, portanto, método, pois do contrário apreendemos o que na realidade insiste em se afirmar como verdade, como imutável, ou seja, sua dimensão instituída. As entrevistas, grupos focais e observação podem acessar somente os sintomas institucionais, suas regularidades, as narrativas e práticas instituídas a depender do método que oriente a utilização de tais técnicas. A cartografia não se reduz a mapear estados de coisas, regularidades e verdades instituídas, embora este exercício seja indispensável para a cartografia. Para a cartografia interessam menos o singular e o diferente e mais os processos de singularização e de diferenciação. Mais do que afirmar que uma experiência local é singular, interessam os processos de singularização que se efetivam na experiência pesquisada.

Daí a afirmação de que conhecer não é representar a realidade [4]. Pois a representação não acessa a dimensão processual da realidade, mas os estados de coisa, as formas instituídas. A análise de implicação é, portanto, uma importante direção metodológica para se acessar os processos de singularização, pois inicia tomando o próprio pesquisador como processual, em devir. As inquietações e as desestabilizações que o campo pesquisado produz no pesquisador são importantes de serem analisadas, pois permitem inaugurar o que se impõe como singularização no processo de pesquisa.

Análise de implicação não é uma análise da intimidade do pesquisador, mas uma análise das forças que afetam o pesquisador. A cartografia começa no meio, entre pesquisador e campo pesquisado. A inseparabilidade entre sujeito que conhece e mundo conhecido toma também como inseparável e condição de pesquisar apreender como processual estes dois polos: sujeito e objeto, em que no limite o objeto propriamente dito é a relação entre sujeito e objeto. O sentido de intervenção se redefine, uma vez que para a cartografia a intervenção não é de um sujeito sobre um objeto. Esse sentido de intervenção só se opera quando se toma sujeito e objeto como polos separados em que o acesso à verdade produz uma intervenção inevitavelmente vertical, como efeito de verdade daquele que conhece sobre a realidade conhecida. Quando não partimos dessa separação, a intervenção refere–se ao que se passa no encontro dos corpos, aos processos de singularização que se inauguram no e pelo ato de pesquisar, entendendo o ato de pesquisar como a instauração de um exercício de problematização da realidade constituída.

Para acessar a dimensão processual da realidade, os processos de singularização, não é possível se colocar em uma posição de suposta externalidade e suposta neutralidade e pautados por regras metodológicas insensíveis às variações do campo. A análise de implicação instaura não um eu–pesquisador, mas um nós–pesquisadores, na medida em que a análise do movimento de co–intervenção modula a ação de “intervir sobre” para uma ação de “intervir com”: um exercício de problematização coletivo acerca das forças que nos limitam (pesquisadores e demais sujeitos), em que o ato de intervenção se volta menos para pessoas e mais para um campo problemático, para as práticas instituídas, para um mundo. A pesquisa mapeia um conjunto de relações e ao mesmo tempo inaugura um conjunto de novas relações. Toda pesquisa é, portanto, pesquisa–intervenção, sendo a cartografia uma proposta de fazer do ato interventivo da pesquisa um ato coletivo e um ato criativo: criação de si e do mundo. A aposta estético–metodológica.

Para que insistir que ao conhecimento são fundamentais os processos de singularização?Estamos às voltas com a inevitável tomada de posição de todo ato de pesquisa, sua finalidade. Para a cartografia, conhecer os processos de singularização é um modo de liberar o processo de conhecimento, liberar o conhecimento da sua dimensão conhecida. Acessar o que ainda não havíamos parado para pensar, conectar o pensamento com o seu fora e ao mesmo tempo retomar a ligação entre conhecer e cuidar. Só se acessam as singularizações cuidando do que se conhece. Conhecer enquanto uma atitude de liberar as linhas de subjetivação (linhas de fuga) das tramas de saber–poder, durante o processo de pesquisa. Daí a máxima da análise institucional ser tão válida para a cartografia: a aposta não é conhecer para transformar, mas transformar para conhecer, pois entende que todo ato de pesquisar é transformador. O método, portanto, é o método que se apropria dessa dimensão transformadora da pesquisa para produzir relações menos autoritárias de saber–poder, num exercício de se pôr ao lado. O exercício de transformação não se reduz a uma etapa posterior à pesquisa em que a partir dos acúmulos finais se saberá a melhor direção. A transformação, por ser inerente e ontologicamente presente ao ato de pesquisar, se efetivará durante a pesquisa enquanto um exercício coletivo. Não se trata aqui de estabelecer de antemão o grau de transformação que uma pesquisa pode instaurar, pois isso não é algo que se possa prever ou controlar. Mas, quanto maior o grau de transversalidade que uma pesquisa puder produzir, maior a amplitude transformadora. Logo, a criação de um campo de conversação entre diferentes atores que nunca conversaram sobre um determinado problema, já é em si transformador, pois insere uma variante no campo. Algumas pesquisas acionam não só um exercício de problematização, mas tomadas de decisão coletivas durante a pesquisa.

As proposições sobre pesquisa participativa trazem muita contribuição para a ampliação do sentido de cartografia e vice–e–versa dentro do que denominamos de uma aposta político–metodológica da cartografia. Por um lado, as proposições da pesquisa participativa trazem uma contribuição política para a cartografia, pois trazem um importante acúmulo sobre a necessidade de inclusão de diferentes pontos de vista e grupos de interesse no ato de produção do conhecimento. Por outro, na cartografia o sentido de participação se amplia uma vez que participação não se refere somente à inclusão de diferentes atores, mas de que eles participam da transformação que se efetua durante a pesquisa. E também porque o pesquisador, por não ser neutro também toma parte, participa, se engaja nessa produção coletiva. O pesquisador é um ao lado e não o acima.

Trata–se de uma estratégia de minimização das linhas de verticalização que o pesquisador assume, sem com isso afirmar que o pesquisador se coloca numa posição de igualdade. Ao contrário, objetiva–se ativar a potência de se ocupar uma posição diferente aos demais sujeitos envolvidos, entendendo que será a partir da expressão das diferenças e singularidades que será possível produzir conhecimento, uma produção comum do conhecimento [11].

O comum não é pacífico, é antes de tudo tenso, agonístico, pois implica a composição de heterogêneos como condição para aumentar a potência de agir [12]. Recuperamos aqui o momento estratégico da pesquisa cartográfica, em que a análise de implicação deve produzir esse efeito de produção de conhecimento comum na pesquisa, sob o risco desta virar uma autoanálise e se perder de vista as linhas de singularização. Ao se pôr na roda e em processo, o pesquisador se atenta aos movimentos de captura, de constituição de grupos identitários que se fecham às diferenças e que limitam as linhas de singularização. No jogo institucional, por exemplo, a multiplicidade é muitas vezes reduzida a polos antagônicos: usuários x trabalhadores, trabalhadores x gestores e assim por diante. O ethos cartográfico implica um movimento de extrair da análise de implicação uma análise do coletivo e os modos pelos quais este plano heterogêneo é capturado em dois polos que produzem jogos de poder que limitam os processos de singularização. O comum é um plano de forças heterogêneas e múltiplas, um plano de pura diferenciação e criação, em que a cartografia se põe como método de acionamento destas diferenças, entendendo esse acionamento como condição de produção do conhecimento. A cartografia argui sobre os processos que limitam as singularidades, entendendo que mais intensa será essa arguição quanto mais coletivo for esse exercício. O conhecimento passa a ser entendido como um exercício de problematização coletivo da realidade, dos processos de captura e dos processos pelos quais é possível criar novas possibilidades.

Implicações e efeitos da produção singular do conhecimento e da produção de um conhecimento singular

Como afirma Deleuze, a cartografia se propõe a traçar diagnósticos locais e singulares. Daí a desconfiança mútua entre o paradigma universal e o paradigma singular da produção de conhecimento. Paira sobre o universal uma desconfiança de fraudulento, pois desconsidera o que no seio do concreto o confronta: a diferença, o heterogêneo, o singular. E paira sobre o singular uma desconfiança de inútil, uma vez que o conhecimento produzido só diz respeito àquele local específico e não podendo ser aplicado a outros contextos. Nesse sentido, cabe mais do que afirmar que são modos distintos de produzir conhecimento, mas identificar que são modos distintos de propagar o conhecimento. Qual a validade e efeito de um conhecimento sobre um local singular específico?[13–14].

Se tomarmos a propagação do conhecimento a partir da premissa do universal que se aplica a diferentes contextos, ou seja, a partir do ideal de modelo, o conhecimento singular e local será sempre desvalorizado. Mas se tomarmos a propagação do conhecimento a partir da premissa de que o conhecimento é mais um exercício de desconstrução de verdades do que de descoberta de verdades, o local tem potencialmente uma força de propagação do conhecimento. Pois o local é sempre um território em se conectam a macro e a micropolítica que são operadas em redes hiperconectadas do/no contemporâneo. A macropolítica não se refere ao global e a micropolítica ao local, são antes instâncias, dimensões da realidade. A macropolítica é o regime das molaridades, dos espaços instituídos pelos aparelhos de Estado que opera por segmentação, divisão e binarizações. Enquanto a micropolítica é o regime das molecularidades, das multiplicidades e produção de subjetividade [15]. São dimensões inseparáveis que se interferem mutuamente e que possuem uma extensividade e intensividade indefinidas a priori. Mas são dimensões que se presentificam e se atualizam em redes locais. Ao invés de universal, passamos a utilizar o termo geral, que diz das regularidades que tendem a ser globais num mundo cada vez mais hiperconectado. Os processos de produção de subjetividade, embora digam mais da micropolítica, são aspectos globais mobilizados pelas modulações do capitalismo: estilos de vida cada vez mais comercializados como identidades pré–fabricadas e prontas para serem consumidas. Do mesmo modo, a macropolítica também tende a um movimento de generalização: os pacotes de uma política econômica mundial. Em termos foucaultianos, a macro e a micropolítica se expressam em diagramas gerais de saber–poder–subjetividade [16–17].

Por isso afirmamos que as regularidades e as formas instituídas interessam à cartografia, mas que são insuficientes para se fazer uma cartografia. As regularidades, os discursos e práticas instituídas são indícios de diagramas gerais de saber–podersubjetividade que por serem históricos e transitórios não se confundem com dimensões ou estruturas universais da realidade. Os diagramas são sempre metaestáveis e transitórios: passamos do diagrama da soberania para o diagrama disciplinar e do diagrama disciplinar para as sociedades de controle [18–21]. Logo, todo conhecimento local é um conhecimento que se produz em diagramas gerais que entrelaçam a micro e a macropolítica.

Porém podemos apreender o local sob duas perspectivas: um ponto de vista que privilegia como o geral se atualiza no local e um ponto de vista que privilegia como o local resiste as sobrecodificações gerais. Na primeira perspectiva, o singular é reduzido ao modo como um diagrama geral se atualiza num local específico. Nesse caso, a variação é senão uma adequação da regra geral ao local. Trata–se de uma análise produzida sob o ângulo do vetor de dominação. Na segunda perspectiva, o singular é um movimento de resistência entendido como movimento de singularização, de desvio do geral, de constituição de processos autônomos e criativos. Daí a necessidade de habitar os territórios [22], entendendo os como territórios geográficos, sociais e subjetivos [23]. Os territórios constituem mapas móveis compostos por linhas de territorialização e desterritorialização que constituem e desconstituem paisagens subjetivas e sociais que se desenham e se apagam em espaços geográficos. Do território é possível acessar um saber local, um saber menor como um movimento de devir minoritário [24].

O singular é antes um processo de singularização, entendido como constituição de linhas de fuga que resistem às linhas de dominação. Embora façamos uma distinção entre as duas perspectivas, uma com ênfase no geral e outra com ênfase no singular, essas duas perspectivas precisam ser adotadas no exercício da cartografia, pois são vetores que coexistem. Nesse sentido, entendemos que a cartografia é sempre mais consistente se operada em conjunção com a genealogia [25].

Genealogia e cartografar se irmanam no compromisso com o atual, com o que se processa no contemporâneo, entendendo o contemporâneo como esta dimensão de captura e liberação da história, o que está em vias de se efetuar. Embora guardem especificidades enquanto métodos distintos. Se para acompanhar o atual nos inserimos em redes locais, não nos esquecemos de nos atentar para os estratos historicamente constituídos que se atualizam nesses territórios.

Afirma–se, portanto, a necessidade de tomar o local não só como singular, mas de extrair o que se mobiliza enquanto movimento de singularização. Para que?Para extrair novos efeitos da produção do conhecimento. Efeitos de propagação e contágio: trata–se de um exercício menos de construir uma verdade e mais de desestabilizar verdades universais, possibilitando a expressão de singularidades e construção de novas verdades. Acompanhar as linhas de singularização em esferas locais produz um efeito que é menos de universalização e unificação, mas de propagação de heterogênese e multiplicidade. Propaga–se a desestabilização, pois a singularização de uma pesquisa não serve de exemplo, de modelo, mas de inspiração de que outro mundo é possível, de que é possível frente a situações adversas se diferenciar do já dado e que, portanto, conhecer é criar.

 

Referências

1 Deleuze G, Guattari F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 1. Rio de Janeiro: Editora 34; 2009.

2 Guatarri F, Rolnik S. Micropolítica: cartografias do desejo. Petrópolis: Editora Vozes; 1996.

3 Rolnik S. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre: Sulinas; 2009

4 Passos E, Kastrup V, Escóssia L. Apresentação. In: Pistas do método da cartografia: pesquisa–intervenção e produção de subjetividade. Editora Sulinas. Porto Alegre. 2009.

5 Jullien F. O diálogo entre as culturas: do universal ao multiculturalismo. Rio de Janeiro: Editora Zahar; 2010.

6 Deleuze G. A filosofia crítica de Kant. Lisboa: Edições 70; 2009.

7 Foucault M. Hermenêutica do Sujeito. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2006.

8 Lourau R. Analista Institucional em tempo integral. In: Sônia Altoé (org) pp. 186–198. São Paulo: Hucitec; 2004.

9 Passos E, Benevides de Barros R. A cartografia como método de pesquisa–intervenção. In Pistas do método da cartografia. Passos et al. (orgs). Sulinas. Porto Alegre. 2009b, pp. 17–31

10 Paulon SMA. Análise de implicação como ferramenta na Pesquisa–Intervenção. Psicologia e Sociedade 2005; 17(3): 16–23.

11 Kastrup, Virgínia e Passos, Eduardo. Cartografar é traçar um plano comum. Fractal, Ver.Psicologia. v.25 –n.2, p.263–280.

12 Hardt M, Negri A. Multidão: guerra e democracia na era do Império. Rio de Janeiro. Record, 2005

13 Deleuze G. Foucault, historiador do presente. In: Carlos Henrique Escobar, (org). Dossier Deleuze. Rio de Janeiro: Hólon Editorial, 1991.

14 Deleuze G. O que é um dispositivo?O mistério de Ariana. Lisboa: Veja – Passagens, 1996.

15 Deleuze G. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 5. Editora 34. Rio de Janeiro. 2002.

16 Foucault M. Vigiar e Punir. Editora Vozes. Petrópolis, 1977.

17 Deleuze G. Foucault. São Paulo: Brasiliense, 1988.

18 Foucault M. Soberania e disciplina. In: Microfísica do poder. Machado R. (org). Editora Graal, Rio de Janeiro, 2001, p. 179–191

19 Foucault M. Em defesa da sociedade. São Paulo: Editora Martins Fontes; 2005.

20 Foucault M. Nascimento da Biopolítica. São Paulo: Editora Martins Fontes; 2008.

21 Deleuze G. Pós–scriptum da sociedade de controle. Revista Latinoamericana Polis 2006;13: 2006. DOI : 10.4000/polis.5509

22 Alvarez J, Passos E. Cartografar é habitar um território existencial. In Pistas do método da cartografia. Passos et al. (orgs.). Sulinas. Porto Alegre. 2009, pp. 131–149

23 Deleuze G, Guatarri F. O que é a filosofia?Editora 34. Rio de Janeiro. 1993.

24 Deleuze G. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol 4. Rio de Janeiro: Editora 34; 2007.

25 Souza TP. A norma da abstinência e o dispositivo drogas: direitos universais em territórios marginais de produção da saúde. Tese de Doutorado. Pós–Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2013.

26 Foucault M. Genealogia e Poder. In: Microfísica do poder. Machado, R. (org). Editora Graal, Rio de Janeiro, 2001b, p. 167– 177