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Conhecimento de professores sobre comportamento

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Conhecimento de professores sobre comportamento suicida em adolescentes

Knowledge of teachers about suicidal behavior in adolescents

Conocimiento de los profesores sobre el comportamiento suicida en los adolescentes


Laura Maria Soja Santos1,5  
Ana Cristina Wesner Viana2,6  
Simone Algeri3,5  
Silvana MariaZarth4,5  


1 Enfermera. Email:lauramssantos31@gmail.com. Autora correspondiente         https://orcid.org/0000-0003-1475-4631
2 Enfermera, Ph.D. Profesora. Email: cristinawesner@ufcspa.edu.br                  https://orcid.org/0000-0002-0290-8288
3 Enfermera, Ph.D. Profesora. Email: salgeri@hcpa.edu.br                                https://orcid.org/0000-0002-3152-0944
4 Enfermera, Ph.D. Profesora, Email: silvana.zarth@ufrgs.br                            https://orcid.org/0000-0002-7033-0182
5 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul (Brazil).
6 Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Rio Grande do Sul (Brazil).

Conflicts of interest: None.

Recibido: Febrero 21, 2021.

Aprobado:  Junio 6, 2022.

Cómo citar este artículo: Santos LMS, Viana ACW, Algeri S, Zarth SM. Knowledge of teachers about suicidal behavior in adolescents. Invest. Educ. Enferm. 2022; 40(2):e11.

DOI: https://doi.org/10.17533/udea.iee.v40n2e11.

 
https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/4.0


Abstract

Objective.
To identify the knowledge of teachers about suicidal behavior in adolescents. Methods. Qualitative exploratory-descriptive study conducted in a state school in the municipality of Porto Alegre, RS, Brazil. Twelve teachers participated in the study. Data were collected through semi-structured interviews analyzed using Bardin’s Content Analysis. Results. Three categories were built: "Warning signs of suicide", related to the signs identified by the professionals; "Risk factors for suicide", which indicate the reasons that may lead adolescents to present this type of behavior; and "Difficulties in dealing with the behaviors", referring to the behaviors adopted by adolescents and the difficulties of teachers before the theme. Conclusion. It was possible to identify that teachers recognize some signs of suicidal behavior, as well as some risk factors. Nonetheless, it is necessary to qualify them to approach the subject, since they feel insecure to act in more critical moments, thus generating mainly feelings of sadness, guilt and powerlessness.

Descriptors: alert; behavior; knowledge; guilt; education; risk factors; mental health; adolescent health; suicide; sadness.



Resumen

Objetivo.
Identificar los conocimientos de los profesores sobre el comportamiento suicida en adolescentes. Métodos. Estudio exploratorio-descriptivo, cualitativo, realizado en una escuela pública del municipio de Porto Alegre, RS, Brasil. Doce profesores participaron en el estudio. Los datos se recogieron mediante entrevistas semiestructuradas, a las cuales se les realizó análisis de contenido según Bardin. Resultados. Se construyeron tres categorías: "Señales de alerta de suicidio", relacionadas con las señales identificadas por los profesionales; "Factores de riesgo de suicidio", que indican las razones que pueden llevar a los adolescentes a presentar este tipo de comportamiento; y "Dificultades para lidiar con los comportamientos", referidas a las conductas adoptadas por los adolescentes y a las dificultades de los profesionales frente al tema. Conclusión. Se pudo identificar que los profesores reconocen algunos signos de comportamiento suicida, así como algunos factores de riesgo. Por ello, es necesario cualificarlas para el abordaje del problema, pues se sienten inseguros para actuar en los momentos más críticos, lo que les generan principalmente sentimientos de tristeza, culpa e impotencia.

Descriptores: alertas; conducta; conocimiento; culpa; educación; factores de riesgo; salud mental; salud del adolescente; suicidio; tristeza.


Resumo

Objetivo
. Identificar o conhecimento de professores sobre comportamento suicida em adolescentes. Métodos. Estudo exploratório-descritivo, qualitativo, realizado em uma escola  estadual no município de Porto Alegre, RS, Brasil. Participaram no estudo 12 professores. Os dados foram coletados mediante entrevistas semiestruturadas analisadas por meio da Análise de Conteúdo de Bardin. Resultados. Foram construídas três categorias: "Sinais de alerta para o suicídio", relacionada com os sinais identificados pelos profissionais; "Fatores de risco para o suicídio", que apontam os motivos que podem levar os adolescentes a apresentarem este tipo de comportamento; e, "Dificuldades em lidar com os comportamentos" referentes às condutas adotadas pelos adolescentes e as dificuldades dos professores frente ao tema. Conclusão. Foi possível identificar que os professores reconhecem alguns sinais de comportamento suicida assim como alguns fatores de risco. Porém, é preciso qualificá-los para a abordagem ao assunto, visto que se sentem inseguros para agir em momentos mais críticos, gerando principalmente sentimentos de tristeza, culpa e impotência.

Descritores: alerta; comportamento; conhecimento; culpa; educação; fatores de risco; saúde mental; saúde do adolescente; suicídio; tristeza.

Introdução


No mundo, um em cada sete jovens de 10 a 19 anos apresenta algum transtorno mental, isto representa 13% da carga global de doenças nessa faixa etária. Doenças como a depressão, ansiedade e distúrbios comportamentais (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e transtorno de conduta) compõem as principais causas comorbidades entre os adolescentes. Já o suicídio é a quarta principal causa de morte entre jovens de 15 a 19 anos.(1) O comportamento suicida compreende a ideação suicida, a tentativa de suicídio e o suicídio propriamente dito.(2) O aumento da incidência na adolescência de comportamentos suicidas pode ser explicado devido ao processo vivido por este indivíduo. Conflitos, mudanças, transformações físicas e socioculturais, que amplificam níveis de ansiedade e depressão, são considerados fatores de risco para este tipo de comportamento.(3) Os professores, por passarem um tempo considerável com seus alunos adolescentes, podem ser fontes de informação sobre sinais indicativos de saúde mental dos mesmos. E quando qualificados, podem auxiliar na identificação de sinais de risco para comportamento suicida ocorridos em âmbito escolar, fazendo parte da rede de apoio em situações de crise.(4)

Diante disto, a escola apresenta um papel importante na promoção e proteção da saúde dos alunos, tendo grande impacto sobre todos os aspectos de suas vidas. Nesse ambiente são reproduzidos padrões de comportamentos e relacionamentos que podem colocar em risco a saúde dos jovens.(2) Portanto, o ambiente escolar pode ser um local privilegiado para a identificação precoce de situações problemáticas  e realização  demedidas preventivas e protetivas. O enfermeiro que participa de ações de educação frente a programas intersetoriais das redes públicas de saúde e de educação, deve participar das atividades interdisciplinares, contribuindo para o desenvolvimento de competências através  de formação, com os profissionais que estão mais próximos aos adolescentes. Em face disso, o objetivo do estudo foi identificar o conhecimento dos professores sobre comportamento suicida em adolescentes.

Métodos


Trata-se de um estudo qualitativo exploratório-descritivo, realizado em uma escola estadual da cidade de Porto Alegre, RS, que atende cerca de 150 crianças e adolescentes entre 6 e 17 anos, do 1º ao 9º ano do ensino fundamental. A escolha do local para estudo foi por conveniência. Foram entrevistados 12 professores, que trabalhavam nos turnos manhã e tarde. Os critérios de inclusão foram: ser professor do ensino fundamental em atividade, ter disponibilidade de horário para participar da entrevista. Foram excluídos professores em Licença Saúde ou Especial no período da coleta de informações. A coleta ocorreu no período de julho a agosto de 2019, mediante entrevista semiestruturada, com questões abertas, respeitando as seguintes temáticas: percepções de comportamentos suicidas, sinais de alerta para o suicídio, motivações para comportamentos suicidas em adolescentes e ações possíveis frente a esses comportamentos e dificuldades frente ao tema. O interesse no tópico da pesquisa foi devido a constatação de casos de tentativas de suicídios em adolescentes.

Os participantes foram abordados cara a cara e informados que a pesquisa seria  realizada por uma acadêmica do curso de graduação em enfermagem e que o resultado dessa pesquisa seria apresentado no meio acadêmico e científico. Os mesmos possuíam conhecimento do roteiro de entrevista. Conforme propõe Gaskell,(5) foram seguidos os passos para a realização das entrevistas individuais.  As entrevistas foram realizadas por uma acadêmica do curso de graduação em enfermagem sob supervisão da responsável pela pesquisa, doutora em enfermagem. A investigadora desenvolveu habilidades e competências para realizar entrevistas durante a sua formação acadêmica.

A entrevista individual foi realizada em um espaço reservado, com data e horário previamente combinados, no próprio local de trabalho do professor, no turno oposto, a fim de não prejudicar a execução de suas atividades laborais e com duração máxima de uma hora. Apenas o entrevistador e o participante ficaram no local da entrevista assegurando a veracidade e anonimato das informações contidas, omitindo o nome dos participantes e substituindo por números. Entre os educadores convidados para participarem da pesquisa não houve recusa. Da mesma forma, não houve desistências durante o estudo. Utilizou-se gravação de áudio para a coleta de dados, estes serão guardados por cinco anos, sob a responsabilidade dos pesquisadores e após esse período, serão destruídos. Não houve necessidade de repetir nenhuma entrevista. As notas foram realizadas após leitura exaustiva das transcrições das entrevistas. As transcrições não foram retornadas aos participantes. Para a análise dos dados foi utilizado o método de Análise de Conteúdo proposto por Bardin. O mesmo consiste em três etapas: Pré-análise, Exploração do material e Tratamento dos resultados, inferência e interpretação.(6) A saturação de dados foi discutida entre os membros da equipe de pesquisa. Os pesquisadores transcreveram as entrevistas em documentos do word e após realizaram a codificação dos dados em uma planilha de excel, fornecendo a descrição das categorias que emergiram após a codificação. As categorias apresentadas na pesquisa foram derivadas dos dados obtidos, sendo apresentadas citações dos participantes para ilustrar os achados de acordo com as mesmas. Houve consistência entre os dados apresentados e os achados principais, sendo claramente apresentados nas descobertas, e com discussão de temas menores ao longo da pesquisa. Devido ao início da pandemia da COVID-19, a referida instituição fechou e não foi possível realizar uma apresentação dos dados encontrados na pesquisa aos participantes.

A pesquisa foi aprovada pela Comissão de Pesquisa da Escola de Enfermagem (COMPESQ/EENF) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (projeto número 36425) e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (número do parecer 3.416.739), em junho de 2019. Houve ainda autorização prévia da instituição de ensino na qual essa pesquisa foi realizada, sendo apresentado o projeto e esclarecidos objetivos pessoais e razões para fazer a pesquisa. Os participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias, sendo uma destinada ao entrevistado e outra ao pesquisador.

Resultados


A análise das entrevistas permitiu agrupar os dados em três categorias: (1) sinais de alerta, (2) fatores de risco e, (3) ações e dificuldades.

Sinais de alerta

Quando questionados, com base na vivência profissional, sobre “quais seriam os sinais de alerta para o suicidio?”, o isolamento é apontado como uma das principais mudanças  observadas  no  comportamento  do  adolescente na escola e a maioria dos participantes da pesquisa afirmam estarem atentos a essa alteração. Igualmente, são relatadas mudanças nos níveis de atividade ou humor: Eu penso que não só o isolamento, como aquela euforia demais. Isso também é uma coisa preocupante (E4); Ela tinha um comportamento muito instável, às vezes ela tava muito deprimida e às vezes ela tava muito feliz (E8).

A autolesão também é mencionada como um sinal de alerta, juntamente com uma mudança na forma de se vestir do adolescente: Daí eu perguntei tu fez isso? Ela me disse: professora eu sinto uma dor tão grande dentro de mim, que eu prefiro sentir uma dor física a sentir essa dor que eu carrego dentro do meu peito (E5); [...] ela vinha muito conversar comigo, eu notava que mesmo no calor ela usava manga comprida e sempre dizendo que um dia ia acabar com a vida dela [...] (E11). A diminuição de rendimento escolar é mencionada como sendo um fato que chama a atenção do professor, acreditando que algo não está bem com o aluno:  Ele começa a tirar nota baixa [...] (E12).

Por fim, outro sinal importante relatado é a ideação suicida. O adolescente, por vezes, expressa a intenção suicida na escola, em momentos onde são questionados ou simplesmente verbalizam o desejo de cometer o ato: Eu já tive casos de aluno que chegou para mim e verbalizou: "eu não quero mais viver'" (E12), Eles dizem: “eu vou me matar”, e a gente acha que é uma criança e não vai… (E11).

Fatores de risco

Quando questionados sobre os possíveis fatores de risco para o desenvolvimento de comportamentos suicidas, alguns entrevistados trazem falas que os relacionam com a questão da aceitação corporal e a baixa autoestima: Eu acho que a aceitação, aquela coisa do padrão, eu sou muito gorda eu não posso ter meu grupo de amizades porque ninguém vai me aceitar ou eu sou magro demais (E1); Tem outro menino que era gordo, ele continua gordinho, mas ficou com mamas, então ele quer porque quer fazer a retirada dessa gordura. Ai vem a questão da aceitação (E6); O bullying que pode ocorrer no ambiente escolar aparece nos relatos como sendo um um motivo de preocupação para os profissionais; Tem alunos que ficam tão aterrorizados com esse tipo de agressão dos colegas (o bullying) que terminam achando que não fazem parte da sociedade porque não são iguais aos padrões que colocam na cabeça (E5).

O uso da internet é mencionado como um elemento importante e que requer atenção, pois há muita facilidade de acesso às mídias sociais e digitais, que podem gerar influências negativas no adolescente: Sem falar na internet. E como eles são vulneráveis, eles têm vergonha de tudo, “o que as pessoas pensam de mim?”, a exposição é uma coisa ... (E8); As pessoas, nossos próprios alunos, vêem muita coisa nas redes sociais. Lembra que tinha um programa nas redes sociais que dizia faça, ou se tu não faz, mata, tem que fazer e matar. Baleia azul (E7); Alguns professores apontam a ocorrência de transtornos psiquiátricos, principalmente a depressão, no desenvolvimento de comportamentos suicidas. Entendo que esse comportamento suicida começa com uma depressão [...] (E1); Por causa de uma depressão, tentava suicídio todo o tempo (E12).

A falta de estrutura familiar, muitas vezes associada a ocorrência de violência doméstica, o uso de álcool e drogas e estar em situação de vulnerabilidade social, já deixa em alerta os profissionais que convivem com estes adolescentes: Primeiro de tudo é a família, a desestrutura familiar pode ser um fator de risco (E8); Têm essas questões sociais a gente pode dizer assim que são bem agravantes, a falta de recursos, de família, o meio onde eles estão, a situação de vulnerabilidade social deles (E12); Um fator que pode levar ao suicídio é a violência doméstica (E12); Um aluno me contou outro dia que a mãe bebe, o pai bebe, o avô bebe e ele bebeu também. Ele me disse que o padrasto deixa-o tomar cerveja. Eu falei pra ele que é errado. Aí tu entende as crianças; geralmente eles são inocentes e tão retratando o que vêem dentro de casa. É complicado (E1).

Ações e dificuldades

Para os professores, quando há uma suspeita de comportamentos suicidas, a conduta mais adotada é a busca de orientações com a Direção ou com o Serviço de Orientação Educacional (SOE) da escola, conforme falas abaixo: Bom, primeiro lugar eu iria procurar ajuda na escola, no SOE, com Direção, procurar apoio no que eu tenho dentro da escola [...] A gente é uma equipe e tem que se ajudar. Então com elas a gente tem que procurar o que a gente pode fazer, procurar os direitos (E2); Eu conversaria com a diretora, com o SOE [...] é difícil (E7).

Alguns relatos falam sobre a importância de comunicar a família: Olha, como eu te falei; é importante chamar os pais com urgência, relatar o fato (E5); Depois (de passar o caso para a direção) nós chamamos o familiar para poder conversar (E9). Conforme as falas, é necessário acompanhar o desfecho do caso, pois, se identificado negligência familiar, outros direcionamentos podem ser realizados: E daí tem isso, passar para Direção, pro Conselho Tutelar; esses são os meios que a gente tem (E10); Se o Conselho Tutelar não consegue resolver isso daí vai para o Ministério Público. Esse é o caminho (E11).

Já a falta de preparo relatada, leva a dificuldades em lidar com a situação, gerando sentimentos de culpa, por não terem conseguido identificar algo antes, e de tristeza, por acreditarem que não conseguem ajudar o suficiente: A gente faz muito mais do que a gente devia, não por questão da gente não querer, mas a gente não tem preparo. Eu tinha muito medo, até quando escrevi uma carta pra aluna hospitalizada por autolesão. Tinha medo do que eu podia ou não falar, a gente não têm orientação, não têm preparo sobre o assunto (E8).

As falas evidenciam o conflito interno dos professores ao se deparar com um aluno apresentando comportamentos suicidas. Condutas adotadas com insegurança os levam à preocupação de estar fazendo algo errado ou que possa piorar a situação do adolescente. Na tentativa de ajudar, os mesmos acabam em sofrimento também: Bah! Acontece uma coisa na sala, amanhã o fulano não vem. Dois dias depois tu fica sabendo que ele tentou suicídio. Nossa, tu se sente culpada porque uma palavra que tu poderia ter dito! (E1); Quando eu peguei a redação dele eu entrei em prantos, comecei a chorar, chorar, chorar. Daí a diretora ficou preocupada, “esse guri vai se matar, a gente tem que fazer alguma coisa”. Eu fiquei bem abalada psicologicamente (E9); Eu fiz o que eu achei que era certo na época, mas hoje eu acho que eu fui meio negligente, eu acho que eu deveria ter chamado antes, ter mandado chamar pai antes, porque tentei conversar com ela sabe, pra não expor isso assim com o pai porque a gente não sabe a profundidade da coisa (E8).

 A sobrecarga de trabalho e a preocupação do professor em alfabetizar também foram citadas como dificuldades referentes à percepção de sinais condizentes aos comportamentos suicidas. Juntamente com a falta de informações para apropriá-los sobre o assunto, esses fatores podem levar os professores a não perceber situações que estão acontecendo com o aluno em sala de aula. As experiências narradas estão a seguir: Mas eles sinalizam, nós que na correria do dia a dia não ficamos tão atentos. (E11) Na criança às vezes a gente tá preocupado em alfabetizar, ensinar disciplina, comportamento e as vezes passa. Se for uma turminha maior, passa despercebido; é um brigando, um na mesa do outro, às vezes pode passar despercebido isso (E3).

Mesmo com a qualificação dos professores, ainda se torna necessário melhorar a sensibilidade e empatia para agir frente a uma situação crítica. As falas corroboram estas como estratégias importantes no que tangem a prevenção do suicídio: Eu to sempre cuidando, sou atenciosa com meus alunos, procuro saber sempre mais, como eles agem fora da escola, como são tratados, eu entro nessas conversas assim pra entender um pouco melhor o que se passa (E5); Eu to fazendo umas dinâmicas com eles. Entro em sala para trabalhar questões de emoção, mas sinto que falta embasamento pra entender melhor os desenhos, os significados, e, aqui nós temos abertura para fazer (E4). Os participantes trazem a importância de estarem atentos a comportamentos de desrespeito entre os adolescentes e dispostos a conversar de forma aberta sobre respeito e individualidade:  [...] quando o aluno vem de outra escola e chama a atenção, muitos não são educados para lidar com as diferenças e começam com brincadeiras que não devem. Eu disse “não, todo mundo tem que se respeitar, ninguém é programado a ter um padrão, vai buscar aquilo no decorrer da vida e nós como seres humanos temos que respeitar”, essa é a mensagem que eu passo pra eles (E5).

Conforme demonstra a afirmação a seguir, os participantes entendem sobre a necessidade de abordar o assunto no âmbito escolar, a fim de que os jovens possam se sentir seguros para compartilhar seus sentimentos. Eu sempre busco falar com eles em sala de aula, eu sou bem franca com eles, conto que eu já tive depressão, problemas sérios, que eu ainda tomo remédio, que eles têm que ser sinceros com isso, pra eles falarem com os pais, falarem com a gente, com um amigo mais velho, sempre alguma coisa para eles buscarem ajuda, prestarem atenção nos amigos (E8).

Discussão


Esse estudo buscou identificar o que conhecem os professores sobre comportamentos suicidas em adolescentes e de que forma enfrentam esta situação em âmbito escolar. O isolamento, juntamente com mudanças de humor, foram apontados como as principais mudanças observadas pelos professores. A literatura descreve o isolamento e as mudanças no humor como sinais de alerta para comportamento suicida, juntamente com a prática de autolesões.(2,7) Corroborando com esses achados, Gijzen et al. usando uma grande amostra da comunidade de adolescentes de 11 a 16 anos, descobriram que a solidão foi um fator central para as redes de depressão e também o fator que mais contribuiu para a ideação suicida.(8) Em relação as mudanças de humor, um estudo demonstrou que anormalidades transitórias de escolha impulsiva são encontradas em um subconjunto daqueles que tentam suicídio. Tanto a ideação quanto o comportamento suicida foram associados à impulsividade de escolha e à dor psicológica intensa.(9) Em relação a desregulação emocional, um estudo realizado com adolescente com transtorno de personalidade bordeline identificou que as participantes que apresentaram maior dificuldade para regular suas experiências emocionais estão em maior risco de realizar uma tentativa de suicídio.(10)

A autolesão de adolescente também foi identificada pelos professores no ambiente escolar. Dados do Ministério da Saúde apontam que, a nível nacional, a faixa etária de 10 a 19 anos aparece em segundo lugar nas ocorrências de autolesões, sendo essa prática considerada fator preditivo para futuras tentativas de suicídio.(11,12) De acordo com esse resultado, estudos demonstram que os principais fatores de risco para autolesões incluem bullying, doenças mentais concomitantes e uma história de abuso e negligência na infância.(12,13) A diminuição do rendimento escolar também aparece como uma mudança importante nas atitudes do adolescente.(2,14) Este acontecimento pode estar associado a um quadro de depressão, caracterizada por uma série de sinais e sintomas que vão além do declínio do desempenho na escola, tais como irritabilidade/instabilidade, dificuldade de concentração, sentimentos de desesperança e/ou culpa, alterações do sono, ideação suícida e tentativas de suicídio. A ideação suicida está diretamente relacionada à maioria dos sintomas de depressão do adolescente.(8,15) Resultados de um estudo demonstram que a ansiedade e o suicídio possuem forte ligação, visto que a ansiedade amplifica a resposta ao estresse, logo, aumentando as tendências suicidas.(16)

Em relação aos fatores de risco citados pelos participantes, os mesmos trazem questões relacionadas a aceitação corporal e baixa autoestima. Adolescentes insatisfeitos com a sua imagem encontram-se, de fato, mais susceptíveis à ideação suicida conforme demonstram dados encontrados na literatura.(2,3) O bullying também surge como sendo um fator de risco, visto que o comportamento suicida na faixa etária estudada, está diversas vezes relacionado a esses atos de violência.(2) Quando falamos sobre bullying, é importante pensar não apenas nas vítimas, mas também nos autores, pois ambos sofrem consequências emocionais e sociais. Porém, a angústia gerada neste processo, é responsável pelo desenvolvimento de sintomas depressivos principalmente nas vítimas.(17)

Segundo dados da UNICEF, a prática do cyberbullying também afeta os jovens. No Brasil, 37% deles afirmam já terem sido vítimas da prática, e 36% informam terem deixado de ir à escola após violência online. Devido a isso, as mídias sociais e digitais também podem influenciar no desenvolvimento de comportamentos suicidas.(2,18) Os resultados de um estudo demonstraram que bullying, cyberbullying e problemas dos pares estão relacionados, indicando uma relação direta e positiva com o comportamento suicida.(19) No que diz respeito às relações familiares, a mesma pode assumir o papel de fator de risco ou de proteção. Dificuldades de relacionamento, comunicação, falta de afeto e apoio, brigas, violência física e verbal, estão presentes em relações familiares disfuncionais. Estar exposto a um ambiente em que o jovem vivencia o deslocamento e sensação de não pertencimento contribui para a ocorrência de comportamento suicida em adolescentes.(14,20)

Por outro lado, há estudos que demonstram que a satisfação nas relação interpessoais, principalmente com a família, é um fator de proteção importantíssimo para tentativa de suicídio, visto que o apoio familiar oferecido tem potencial para diminuir o impacto psicológico de situações difíceis enfrentadas pelo indivíduo.(20) Um estudo de revisão, identificou que os fatores de proteção mais comuns, tanto para o suicídio quanto para o bullying, foram ser do sexo feminino, ter boa saúde mental, pertencer a uma família biparental, ambiente escolar seguro, bom relacionamento familiar e ter professor envolvido.(21) O uso de bebidas alcoólicas e drogas também apresenta-se como fator de risco, como demonstrado por Neto e Pelizzari, que após pesquisas em prontuários de jovens acompanhados em um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS AD), com idades entre 12 e 18 anos, 97% dos registros analisados com queixa de tentativa de suicídio possuíam relação com ingestão alcoólica. O uso de drogas como maconha e cocaína, prática de autolesão e ser do gênero feminino, também são citados como fatores de risco pelos autores.(22. Neste sentido, evidências identificam que a vulnerabilidade social em adolescentes, se relaciona a aspectos negativos, principalmente os associados ao envolvimento com drogas, perda de garantia dos direitos e oportunidades nas áreas de educação, saúde e proteção social, com situações de violência, seja ela doméstica ou comunitária, e trabalho infantil.(19)
 

Apesar de ainda ser tratado como tabu, as questões referentes ao sofrimento psíquico e o transtorno mental, principalmente na fase da adolescência, vêm tomando espaço no ambiente escolar e necessitando de intervenções rápidas e precoces, a fim de evitar que esse jovem chegue a desenvolver comportamentos de risco que culminem em suicídio. A exemplo, de um estudo europeu, multicêntrico, que realizou uma intervenção intitulada Programa Jovem Consciente da Saúde Mental, que teve como objetivo a prevenção de suicídio na escola para alunos em situação de risco. O programa foi eficaz na redução do número de tentativas de suicídio e ideação suicida grave em adolescentes escolares a longo prazo (12meses).(23) Sendo assim, considerando o protagonismo da escola na vida de crianças e adolescentes, fica evidente que esse é um ambiente privilegiado para promoção da saúde mental e prevenção do suicídio. A inserção de estratégias de prevenção ao suicídio dentro das escolas mostra-se necessárias.

Durante o estudo evidencia-se a falta de contato de educadores com a temática, durante sua formação e no trabalho nas escolas, fato que pode ser observado através dos relatos sobre a dificuldade na hora de agir frente a um caso de comportamento suicida. Concomitantemente, a essa pesquisa, outro estudo similar, demonstra que os professores desconhecem os sinais de alerta de comportamento suicida entre os alunos. Também relatam que não sabem como apoiar os alunos em caso de tentativa ou suicídio consumado de outro aluno. Reforçando os dados encontrados na presente pesquisa. Também, foi apontado que o currículo escolar é percebido como carente de informações sobre suicídio e comportamento suicida.(24)

A ação assumida pelo professor demonstra a preocupação desse profissional pela temática e em especial a preocupação com seu aluno enquanto ser humano que, por vezes, precisa se sentir seguro para ser ouvido, verdadeiramente ouvido. O suicídio, considerado um problema de saúde pública.(1) requer que enfermeiros inseridos no contexto de educação em saúde e através do Programa Saúde na Escola,(25) promovam o fortalecimento dos vínculos entre família, alunos e professores, criando espaços de discussão para sistematizar, refletir e organizar um trabalho  intersetorial a fim de superar as dificuldades relacionadas ao assunto em discussão. A incompreensão acerca do tema gera desconforto emocional em todos os envolvidos, e cabe ao profissional de saúde acolher esta demanda, seja por parte dos adolescentes ou professores, e auxiliar na prevenção e promoção da saúde.

As limitações do estudo foram devido ao número de participantes e a pesquisa ter sido realizada em um único centro, o que não permite que os resultados sejam generalizados. Há necessidade de ampliar os estudos sobre o trabalho do enfermeiro em contexto escolar, a fim de que se possa auxiliar profissionais da área da educação na identificação precoce de casos potenciais de suicídio. Contudo, esse estudo pode servir como base para novos estudos, e os resultados podem ser utilizados para melhorar os cuidados de saúde na escola, prevenir suicídio em adolescentes e/ou embasar políticas que visem alcançar esses objetivos.

Conclusão.
Foi possível identificar que os professores reconhecem alguns sinais de comportamento suicida assim como alguns fatores de risco. Porém, é preciso qualificá-los para a abordagem ao assunto, visto que se sentem inseguros para agir em momentos mais críticos, gerando principalmente sentimentos de tristeza, culpa e impotência.

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